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14 de julho de 2014

O que é a informação quântica?

Há alguns anos, termos como “computação quântica” e “comunicação quântica” eram pouco conhecidos por acadêmicos e desconhecidos para o público leigo. O desenvolvimento tecnológico, contudo, não somente tem modificado esse cenário como a física quântica, com o passar dos anos, desperta o interesse de um número cada vez maior de pesquisadores Informacao_quantica-_Miled-_350por ser considerado um promissor campo de pesquisa.

Estudos realizados pelo Grupo de Óptica e Informação Quântica do Instituto de Física de São Carlos (IFSC/USP), coordenados pelo docente Miled Hassan Youssef Moussa, é uma das provas disso. “Quando terminei meu doutorado, em 1990, não se falava em informação, computação e comunicação quânticas. Essa era uma área apenas voltada à fundamentação da mecânica quântica e, até então, o interesse nela era periférico. Hoje, é uma área com forte apelo tecnológico e uma das que mais cresce e tem impacto sobre todas as demais áreas da física de baixas energias”, afirma Miled.

Atualmente, todas as áreas de física de baixas energias- ressonância magnética nuclear, física do estado sólido, óptica quântica etc. – estão direta ou indiretamente relacionadas à informação quântica. Isso quer dizer que, no futuro próximo, toda tecnologia da qual usufruiremos em nosso dia a dia terá como base as respostas fundamentadas nesses estudos. Ou será que já usufruímos de tais dispositivos tecnológicos?

O básico necessário para a prática possível

A resposta é “sim”. O uso do raio laser na medicina e nos aparelhos eletrônicos, e o uso da ressonância magnética nuclear para realização de diversos tipos de exames, por exemplo, só são possíveis graças aos estudos ligados à física quântica. Porém, mesmo que já existam aplicações advindas de estudos da área de física quântica, ainda há muitas informações a serem desvendadas.

Partindo do princípio, pesquisas em física quântica compreendem desde algumas moléculas até átomos, suas partículas fundamentais (prótons, nêutrons, elétrons) e componentes das partículas fundamentais (quarks, fótons etc.). O chamado “estado quântico” é aquele que caracteriza a matéria quântica. A sobreposição de estados, por exemplo, é uma característica exclusiva da matéria e dos campos que se comportam de acordo com as leis da mecânica quântica. “Exemplificando, é como se uma pessoa pudesse estar em diversos locais ao mesmo tempo, realizando tarefas distintas”, explica Miled.

Aplicando-se esse conceito tecnologicamente, os computadores atuais, que têm seus comandos determinados pela linguagem binária de 1 ou 0, na computação quântica tem uma nova possibilidade: 1 e 0. “Da mesma maneira que uma partícula quântica pode estar em dois locais ao mesmo tempo, o quantum bit também possuirá essa capacidade. Ou seja, a lógica tradicional do ‘sim’ ou ‘não’ dá lugar ao ‘sim’ e ‘não'”, elucida o docente. “Essa nova metodologia possibilitará que os computadores sejam muito mais velozes, por exemplo”.

Particularidades do mundo quântico

Apesar do grande potencial que sistemas quânticos aparentam ter, diversos pesquisadores ainda tentam descobrir como lidar com suas fragilidades. Uma delas é a considerável influência que o meio ambiente exerce sobre tais sistemas. E para que eles atinjam seu máximo potencial, seu estado puro (sem influência do meio) precisa ser conservado. E eis o grande gargalo dos estudos nessa área. A chamada “mistura estatística” é o termo cunhado para descrever a ausência (indesejável) desse estado puro nos sistemas quânticos. “O meio ambiente necessariamente conduz o estado puro de um sistema quântico para uma mistura estatística de estados”, elucida Miled.

Dentro dessa lógica, vários pesquisadores já propuseram soluções, mas, até o momento, nenhuma delas resolveu as problemáticas da física quântica. Em 1996, os físicos Juan Ignacio Cirac e Peter Zoller lançaram o “esquema da Engenharia de Reservatório”: sistemas quânticos, em contato com reservatórios térmicos, poderiam manter sua pureza influenciados por um sistema auxiliar. De acordo com os pesquisadores, este segundo influenciaria a maneira pela qual o sistema quântico enxerga o reservatório térmico, impedindo sua transformação em mistura estatística. A falha desse esquema é que ele se aplica apenas a estados pré-determinados e não a estados arbitrários, conforme se requer para o processamento da informação quântica.

Uma forma de contornar o problema da proposta de Cirac e Zoller foi sugerida pelo grupo do Miled*, na qual estados não estacionários, que se modificam com o passar do tempo, são utilizados para que se mantenham aproximadamente puros apesar da ação do meio ambiente.

Outra proposta para resolução das “interrogações quânticas” é de autoria de Gentil de Morais Neto, ex-aluno de doutorado do Miled, e hoje no pós-doutorado, supervisionado pelo docente do IFSC/USP, José Carlos Egues de Menezes.

Suponha que uma mensagem com uma sucessão de estados quânticos, partindo de um emissor para um receptor, deva chegar mantendo seus estados puros, através de um canal quântico. Levando-se em conta que essa mensagem esteja sob a ação indesejável do meio ambiente, como evitar que ela seja “contaminada”?

Através do chamado “tunelamento dissipativo não local”, proposto por Gentil, Miled e o pesquisador da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Mickel de Ponte** , foi criado um mecanismo capaz de manter o estado puro da mensagem que, durante seu trajeto, leva ao “emaranhamento quântico” do emissor com o receptor (veja definição no quadro ao lado). Emaranhamento_quantico-_Miled-350Em função do emaranhamento, a mensagem não precisa passar pelos sistemas que compõem o canal quântico e que estão em contato com o meio ambiente. A alternativa criada, portanto, foi o envio da informação diretamente do emissor para o receptor (daí o termo “tunelamento”), levando a mensagem da origem ao destino sem maior contato com o meio ambiente, conservando quase que completamente a pureza dos estados e, portanto, a fidelidade da mensagem. “Para que a mensagem seja entregue, o canal quântico continua necessário, mas apenas como ‘degrau virtual’ no processo de transferência da informação, sendo ocupado apenas virtualmente”, explica Miled.

A contribuição de Gentil no resultado acima diz respeito à resolução analítica dessa problemática. Isso porque dois grupos italianos já haviam verificado a possibilidade do processo de forma numérica.

Outra estratégia para evitar a transformação do sistema quântico em mistura estatística foi aplicada recentemente ao “estado de número”. Os pesquisadores do grupo de Miled propuseram dois esquemas distintos para manter a pureza dos estados de número também em dois contextos físicos diferentes: Armadilhas Iônicas e Eletrodinâmica Quântica de Cavidade. “A forma de se manter a pureza do sistema em cavidades é diferente da maneira como se faz em íons aprisionados. Estamos tentando, ainda, uma terceira maneira, via ‘localização de Anderson’, trabalho iniciado pelo em 1990 por J. R. Kuklinski”, conta Miled.

Todas as propostas têm como objetivo principal responder a uma única pergunta: como conservar, ao máximo, o estado quântico puro da matéria? Achar essas respostas é, certamente, dar mais um passo em direção à evolução tecnológica.

*Referência: J. Phys. B: At. Mol. Opt. Phys. 41 085504 (2008);

**Referência: Phys. Rev. A 85, 052303 (2012) e EPL  103,    43001   (2013)

Assessoria de Comunicação

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Instituto de Física de São Carlos - IFSC Universidade de São Paulo - USP
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