Notícias Ciência Tecnologia

Para a seção Notícias de Ciência e Tecnologia (sob coordenadoria do Prof. Onody)

1 de dezembro de 2020

Em experimentos realizados nos LSND e FERMILAB – O quarto Neutrino

Resultados experimentais (Fermilab). Probabilidade de oscilação dos neutrinos versus distância (em escala logarítmica). Neutrinos do múon (vermelho), Neutrinos do tau (azul), Neutrinos do elétron (verde) e Neutrinos estéril (cinza). – Crédito: American Physical Society/ Carin Cain

Por: Prof. Roberto N. Onody*

Os neutrinos são partículas elementares que interagem através da força gravitacional e da força nuclear fraca. São muito evasivos e de difícil detecção. Eles são produzidos pela interação fraca e estão sempre associados a um lépton carregado: um elétron, um múon ou um tau. Dizemos que há 3 tipos de neutrinos ou 3 sabores (na linguagem da mecânica quântica). Há cerca de duas décadas sabe-se que esses três tipos podem se transformar uns nos outros – a chamada oscilação do neutrino. Essa descoberta levou ao Prêmio Nobel de Física de 2015.

A possibilidade de existir um quarto neutrino, o neutrino estéril, surgiu após os resultados de experimentos realizados no Laboratório Nacional de Los Álamos (LSND) e no Fermilab (Mini Booster Neutrino Experiment, MiniBooNE) 1.  Esses experimentos detectaram um excesso de neutrinos do elétron a partir de um feixe de neutrinos do múon. Para reconciliar os dados experimentais com a teoria, foi proposto um quarto neutrino. Eles calcularam que diferença da massa ao quadrado entre o neutrino estéril e do neutrino do elétron, isto é, m2estéril – m2elétron, deveria ser de 1 eV2 (eletronvolt ao quadrado).

O neutrino estéril não interage pela força fraca, mas poderia participar do processo de oscilação dos outros três (ativos) neutrinos e, eventualmente, causar a transformação do neutrino do múon em neutrino do elétron em curtas distâncias.

Se ele existir, o Modelo Padrão (atualmente, nossa melhor teoria para as partículas elementares e suas interações) teria de ser modificado ou estendido. Os neutrinos estéreis seriam também ótimo candidatos para compor a Matéria Escura, com consequências importantes na Cosmologia.

A distância necessária para que um neutrino se transforme em outro tipo de neutrino, depende das energias dos neutrinos envolvidos e da diferença de suas massas ao quadrado.

Recentemente 2, dois enormes grupos internacionais de pesquisa, com mais de 260 cientistas, realizaram experimentos que testaram a existência do neutrino estéril.

O grupo MINOS+ 2 investigou o desaparecimento de neutrinos do múon, produzidos por um acelerador no Fermilab. Com seus detectores posicionados a distâncias entre 1 e 735 km, eles obtiveram a curva de probabilidade de oscilação do neutrino como função da distância3 (veja figura). Vemos que a probabilidade de formação do quarto neutrino é praticamente nula, a não ser a curtas distâncias de uns poucos quilômetros. Por outro lado, a uma distância de cerca de 500 km, a probabilidade de o neutrino do múon ter-se transformado em neutrino do tau é de quase 50%.

Já o grupo Daya Bay 2, na China, acompanhou o desaparecimento de anti -neutrinos do elétron produzidos por seis reatores nucleares, com 8 detetores colocados a distâncias entre 360m e 1,9 km.

Os grupos do MINOS+ e do Daya Bay combinaram, então, seus dados. Seus resultados eliminaram qualquer possibilidade de que a diferença dos quadrados das massas do neutrino estéril e do neutrino do elétron (mass splitting) esteja no intervalo entre 10 – 4 a 10 3 eV2, o que contradiz o valor de 1 eV2, estimado pelos próprios autores que propuseram a existência do neutrino estéril 1.

Conclusão – muito embora a existência do neutrino estéril ainda não possa ser totalmente descartada, sua realidade é bastante improvável.

Referências:

1 A. Aguilar et al. (LSND Collaboration), Phys. Rev. D 64, 112007 (2001) e A. Aguilar-Arevalo et al. (MiniBooNE Collaboration), Phys. Rev. Lett. 110, 161801 (2013).

2 P. Adamson et al, Phys. Rev. Lett. 125, 071801 (2020)

3 V. Niro e P. Machado, Physics 13, 123 (2020)

*Físico, Professor Sênior do IFSC – USP

(Agradecimento: Sr. Rui Sintra da Assessoria de Comunicação)

Assessoria de Comunicação – IFSC/USP

 

27 de novembro de 2020

Bio-impressão 3D para o estudo do aneurisma cerebral

Por: Prof. Roberto N. Onody*

Um aneurisma cerebral é uma dilatação anormal da parede de uma artéria no cérebro que, ao romper-se, provoca hemorragia que pode resultar num acidente vascular cerebral (AVC). No AVC há perda de circulação e oxigenação do cérebro que, se não socorrido prontamente, pode levar ao óbito.

O modelo de aneurisma bio-impresso. Em verde, as células endoteliais, em vermelho o coágulo. (Crédito: Jang et al. 1)

Os aneurismas podem ser congênitos ou formados por traumas, infecções e hipertensão arterial. Acredita-se que 1 em cada 15 pessoas desenvolva um aneurisma ao longo de sua vida. Após a ruptura do aneurisma cerebral, há cerca de 25% de probabilidade de morrer em 24 horas, 25% de vir a falecer em 3 meses e 25% de deixar uma sequela permanente. O socorro médico, em geral, consiste em dois tratamentos: clipagem do aneurisma com microcirurgia intracraniana e endovascular, com a embolização ou oclusão do aneurisma com stents ou espirais de platina. Após a inserção da mola de platina no saco formado pelo aneurisma, forma-se um trombo que estanca a hemorragia. O tratamento endovascular tem sido o preferido pelos médicos nos últimos anos, pois é menos invasivo, mais barato e o paciente permanece menos tempo hospitalizado. Dessa maneira, a pesquisa recente tem sido direcionada para desenvolver novos dispositivos e novos materiais para a técnica endovascular. Certamente, uma avaliação in vitro da performance de coagulação desses dispositivos e de previsão antecipada dos seus efeitos, antes de implantá-los no paciente, é muito importante.

Com esse objetivo, cientistas do Laboratório Nacional Lawrence Livermore1 (EUA) utilizaram hidrogel de fibrina-gelatina para imprimir, em 3D, uma estrutura na forma de um aneurisma. O material utilizado – hidrogel de fibrina-gelatina, foi escolhido por dois motivos: ter a mesma rigidez mecânica dos tecidos cerebrais e por ser transparente, permitindo visualizar e medir a variação do fluxo do plasma nos vasos bio-impressos. Isso tornou possível a equipe comparar seus resultados experimentais com aqueles computacionais, baseados em modelos 3D de dinâmica dos fluidos.

Esses vasos bio-impressos tiveram suas paredes internas revestidas com células endoteliais microvasculares do cérebro humano. Em seguida, eles injetaram plasma sanguíneo de bovinos nos vasos. Controlando a velocidade do plasma, eles provocaram hemorragia no saco do aneurisma (pré-fabricado na junção de três vasos, veja figura). Iniciaram então, o tratamento médico propriamente dito. Conduziram, através de um micro cateter, uma espiral de platina até o aneurisma.  Em pouco tempo, eles observaram a formação de um coágulo em torno da mola de platina!

Portanto, essa técnica abre espaço para se estudar novos materiais bio-compatíveis, a eficiência de dispositivos de embolização, fornece informações hemodinâmicas e permite determinar o tempo de cura do tratamento utilizado 2.

1 Lindy K Jang , Javier A Alvarado , Marianna Pepona , Elisa M Wasson , Landon D Nash , Jason M Ortega , Amanda Randles, Duncan J Maitland , Monica L Moya and William F Hynes, Biofabrication 13 (2021) 015006

2 https://www.sciencealert.com/scientists-have-3d-printed-a-living-brain-aneurysm-out-of-human-cells

*Físico, Professor Sênior do IFSC – USP

(Agradecimento: Sr. Rui Sintra da Assessoria de Comunicação)

Figuras: Simptomi Bolesti e Bio-impressão 3D para o estudo do aneurisma cerebral

Assessoria de Comunicação – IFSC/USP

24 de novembro de 2020

Lefaudeux consegue a melhor fotografia astronômica de 2020

Por: Prof. Roberto N. Onody*

Na 12ª. edição do concurso de fotografia Astronomy Photographer of the Year, patrocinado pela Royal Observatory Greenwich, BBC Sky at Night Magazine e a Insight Investment, o vencedor geral, entre todas as categorias, foi o francês Nicolas Lefaudeux.

Ele fotografou a galáxia de Andrômeda utilizando um efeito chamado tilt-shift, com as bordas externas da foto desfocadas (veja foto). O valor do seu prêmio foi de 10.000 libras esterlinas. Sua foto foi selecionada entre 5.000 imagens concorrentes de vários continentes.

A melhor fotografia astronômica de 2020 (Crédito: Nicolas Lefaudeux – França)

O concurso também premiou categorias como Nossa Lua, Aurora, planetas, cometas e asteroides etc. Na categoria pessoas e espaço, o vencedor foi o húngaro Rafael Schmall, que fotografou a estrela dupla Albireo. Em longa exposição, a foto mostra as trilhas deixadas pelos satélites da Starlink que obstruem a imagem1.

Referência:

1 https://gizmodo.uol.com.br/melhores-fotos-astronomia-2020/

*Físico, Professor Sênior do IFSC – USP

(Agradecimento: Sr. Rui Sintra da Assessoria de Comunicação)

Assessoria de Comunicação – IFSC/USP

20 de novembro de 2020

Uma nova liga que é superelástica num grande intervalo de temperatura

Por: Prof. Roberto N. Onody*

Ligas superelásticas são ligas metálicas que podem sofrer grandes deformações, de até 20%, e retornam, automaticamente, à sua forma original. Essa característica desejável tem aplicações importantes em medicina e ortodontia. Explica-se o surgimento da superelasticidade em materiais nos quais a tensão induz a presença de transformações martensíticas (transformações martensíticas são aquelas em que nenhum átomo da estrutura cristalina se desloca mais do que um parâmetro de rede, ou seja, são transformações praticamente reversíveis).

Um exemplo, muito comum, de liga superelástica é a liga de Níquel-Titânio. Largamente utilizado em aplicações médicas tem, além de suas ótimas propriedades mecânicas, excelente resistência à corrosão. Há, porém, dois problemas. O primeiro é o efeito destruidor da superelasticidade pela temperatura. O segundo está no custo do material. Dessa forma, os pesquisadores vêm investigando materiais mais baratos e que permaneçam, na fase superelástica, num grande intervalo (“janela”) de temperatura. Fundamentalmente, todos esses protótipos se baseiam no elemento químico Ferro 1.

Recentemente, em um estudo publicado na Science 2, um grupo de pesquisadores da Universidade de Tohoku do japão investigou as propriedades de uma liga de Fe-Mn-Al-Ni com adição de Cromo. Eles demonstraram que o acréscimo do Cromo praticamente não leva a nenhuma variação da entropia. Para isso, eles utilizaram a relação de Clausius-Clapeyron, que é uma relação linear entre a variação de entropia e a variação da tensão crítica com a temperatura. A tensão crítica é a tensão acima da qual o material tem deformação plástica, não mais retornando ao seu estado original.

Figura: Legenda: B) As “Janelas” de temperatura’ (na escala Kelvin) de vários materiais. Compare, em particular, a diferença entre o novo material (em vermelho) e a usual liga de Níquel-Titânio (preto); C) As “janelas” de variações de temperatura durante o dia e à noite na Lua, Marte e Terra. Crédito: Ji Xia et al. 2

Eles obtiveram uma liga que se mantém superelástica num grande intervalo de temperatura. Mais especificamente, para temperaturas entre -263 oC  e + 200 oC (veja figura B). Claro, talvez as aplicações médicas ou odontológicas não necessitem dessa enorme “janela” de temperatura, mas certamente desperta o interesse da indústria aeroespacial, pois as variações de temperatura de dia e à noite na Lua, em Marte e na Terra se enquadram perfeitamente na “janela” de temperatura em que o novo material é superelástico.

1 https://science.sciencemag.org/content/369/6505/855

2 Ji Xia , Yuki Noguchi , Xiao Xu , Takumi Odaira , Yuta Kimura , Makoto Nagasako , Toshihiro Omori1, Ryosuke Kainuma , Science 14 Aug 2020: Vol.369, Issue 6505, pp. 855-858

*Físico, Professor Sênior do IFSC – USP

(Agradecimento: Sr. Rui Sintra da Assessoria de Comunicação)

 Assessoria de Comunicação – IFSC/USP

17 de novembro de 2020

Na Escola de Medicina de Yale: Removendo células neuronais mortas

Por: Prof. Roberto N. Onody*

Um grupo da Escola de Medicina de Yale1 conseguiu captar imagens do processo de remoção de neurônios mortos no cérebro de camundongos vivos. A morte das células e sua remoção é essencial à saúde dos animais e vegetais, um mal funcionamento desse mecanismo pode acarretar o surgimento de processos cancerígenos, comprometer a regulagem do sistema imunológico e a defesa contra patógenos infecciosos intracelulares.

Em geral, as células morrem ou de maneira acidental, com necrose provocada por trauma, interrupção do fluxo sanguíneo etc. ou por apoptose – a morte celular programada. No ser humano morrem, todo dia, bilhões de células entre as cerca de 30 trilhões de células que temos no nosso corpo. A observação da morte de células por apoptose é particularmente difícil por dois motivos: não sabemos quando e nem onde ocorrerá a sua morte e a remoção dessas células moribundas, feita pelos fagócitos, é muito rápida.

Damisah et al 1, empregaram técnicas fotoquímicas e de metodologias virais para induzirem a morte de células que, combinadas com imagem de microscopia intravital, permitiram o mapeamento e acompanhamento dos fagócitos envolvidos na eliminação do neurônio morto 2. Os fagócitos envolvidos na eliminação do neurônio foram o astrócito e a micróglia.  O estudo revelou um trabalho harmônico, equilibrado e coordenado entre os dois fagócitos, com cada um desempenhando uma função bem especializada. As micróglias encarregam-se do corpo e do núcleo do neurônio enquanto os astrócitos destroem os dendritos.

O estudo também comparou a resposta de camundongos novos, com cerca de 4 meses de idade, com camundongos mais velhos com média de 26 meses de idade. Logo após aplicação do método de morte induzida nas células, chamado de 2Phatal (utiliza laser pulsado de fentossegundos), o núcleo das células neuronais se condensa, isso é uma sinalização para a entrada em ação dos fagócitos que removerão as células mortas. Não houve grande discrepância entre o número de células mortas em camundongos jovens e velhos. Entretanto, quando se comparou o tempo de limpeza e remoção dessas células mortas, a diferença foi enorme. O grupo jovem teve a limpeza completada em cerca de 26 horas, já no grupo idoso levou aproximadamente 58 horas. Essa demora em descartar o lixo pode ser um novo mecanismo de quebra de equilíbrio homeostático levando eventualmente a processos neurodegenerativos e de autoimunidade.

Legenda da foto: Células especializadas chamadas micróglias engolfam o corpo do neurônio morto, enquanto os astrócitos destroem as conexões desse neurônio.

Crédito: Eyiyemisi et al 1

1 Eyiyemisi C. Damisah, Robert A. Hill, Anupama Rai , Fuyi Chen , Carla V. Rothlin, Sourav Ghosh, Jaime Grutzendler, Science Advances, jun/2020, vol. 6, no. 26, eaba3239

DOI: 10.1126/sciadv.aba3239

2 https://www.youtube.com/watch?v=_BixMMfPkhU&feature=emb_title

*Físico, Professor Sênior do IFSC – USP

(Agradecimento: Sr. Rui Sintra da Assessoria de Comunicação)

Assessoria de Comunicação – IFSC/USP

12 de novembro de 2020

Fica o questionamento científico – E Betelgeuse não explodiu?

Por: Prof. Roberto N. Onody*

Betelgeuse é a estrela supergigante vermelha mais próxima da Terra. Fica na constelação de Órion, a uma distância de cerca de 500 anos-luz, tem massa equivalente a aproximadamente 15 massas solares e diâmetro mil vezes maior que o do Sol.

Pelo seu gigantismo, é uma estrela que deverá terminar sua curta vida de maneira espetacular, explodindo como uma supernova. Na verdade, no final de 2019 e começo de 2020, a estrela experimentou uma diminuição dramática e prolongada de seu brilho. Isso criou uma enorme expectativa, não só entre os astrônomos mas do público em geral, de que Betelgeuse explodiria como uma supernova.

Todos torcíamos para ver uma pequena estrela brilhando no nosso céu durante o dia. Porém, com o retorno ao seu brilho original, a possibilidade de uma iminente explosão foi abandonada e os astrônomos saíram atrás de explicações para o fenômeno ocorrido.

Estrelas vermelhas supergigantes perdem massa e têm pulsações durante as quais o material da superfície estelar é ejetado para o meio interestelar e carregado por fortes ventos solares.

Em trabalho publicado recentemente no Astronomical Physical Letters,  Dharmawardena et al 1 verificaram que a luminosidade de Betelgeuse também havia diminuído em comprimentos de onda de sub-milímetros. Observações realizadas com o Telescópio James Clerk Maxwell, nas faixas de 450 e 850 µm, mostraram uma diminuição de 20 % da luminosidade.

Estudando modelos de transferência radioativa, eles chegaram à conclusão de que uma mudança na fotosfera ocorreu e foi responsável pela diminuição da luminosidade de Betelgeuse. Segundo os cálculos, bastaria uma redução de 10% no raio da estrela ou de 200 K na sua temperatura, para explicar a diminuição de 20% na luminosidade.

Paralelamente, observações feitas em luz ultravioleta pelo telescópio Hubble entre os meses de outubro e novembro de 2019, indicaram uma grande quantidade de plasma sendo ejetado de Betelgeuse a cerca de 320.000 km/h. Em dezembro, a luminosidade da estrela começou a cair. Segundo estudo realizado por Andrea Dupree et al 2, esse material foi ejetado por toda a superfície da estrela e não somente pelos polos do seu eixo de rotação, como preveem os modelos estelares. À medida que o gás ejetado se condensou, formou uma nuvem de poeira que se posicionou na nossa linha de visão diminuindo, assim, a luminosidade de Betelgeuse.

O ponto de interrogação no título fica por conta da velocidade da luz, pois pode ser que Betelgeuse tenha explodido ontem, mas só ficaremos sabendo daqui a 500 anos!

Referências:

1 Thavisha E. Dharmawardena, Steve Mairs , Peter Scicluna , Graham Bell , Iain McDonald , Karl Menten , Axel Weiss , and Albert Zijlstra,

The Astrophysical Journal Letters, 897:L9 (7pp), 2020 July 1

2 Andrea K. Dupree, Klaus G. Strassmeier, Lynn D. Matthews, Han Uitenbroek, Thomas Calderwood, Thomas Granzer, Edward F. Guinan, Reimar Leike, Miguel Montargès, Anita M. S. Richards, Richard Wasatonic, and Michael Weber

The Astrophysical Journal, volume 899, Number 1, 68

*Físico, Professor Sênior do IFSC – USP

(Agradecimento: Sr. Rui Sintra da Assessoria de Comunicação)

Assessoria de Comunicação – IFSC/USP

10 de novembro de 2020

A Solução da Conjectura de Keller – verdadeira, ou falsa?

Figura 1 – À esquerda: espaço 2-dimensional, ao ser coberto por quadrados, sempre haverá arestas (face 1-dimensional) de dois quadrados diferentes, representadas por linhas mais grossas na figura, totalmente coincidentes. À direita: espaço 3-dimensional, ao ser coberto por cubos, sempre haverá quadrados (face 2-dimensional) de dois cubos diferentes, representados pela cor preta na figura, totalmente coincidentes – Crédito: J.Brakensiek et al 1

Por: Roberto N. Onody*

Um cubo A (também chamado, às vezes, de hipercubo) em n dimensões tem todas as arestas iguais a b e volume bn. Suas faces têm dimensão (n-1). Supondo que esses cubos A são maciços (isto é, que eles não possam se interpenetrar), dizemos que cobrimos um espaço de dimensão n com esses cubos A, se e somente se, todos os pontos desse espaço estão no interior de algum cubo ou nas suas faces de contacto (veja figura 1). Não poderá haver lacunas no espaço.

Um cubo, centrado na origem do sistema de coordenadas, tem todos os seus pontos representados por uma n-upla (x1 ,x2 ,…,xn)  de números reais tais que xi está no intervalo fechado [-b/2,b/2], i = 1,…n . O número de faces de dimensão n-1 é 2n e o número de vértices é 2n. Para cobrir o espaço n-dimensional, colocamos (justapomos) um número infinito de cubos idênticos, mas com centros diferentes, que poderão ser transladados, nas faces de contacto, em qualquer uma das n direções e nos dois sentidos.

Grato de Keller

Em 1930, H. O. Keller propôs sua conjectura: “Num espaço n-dimensional, a justaposição de cubos para cobrir todo o espaço, sempre existirá um par de cubos que compartilharão uma face completa (inteira) de dimensão (n-1)”.

Em 1940, O. Perron provou que a conjectura de Keller é verdadeira para n menor ou igual a 6. Em 2002, J. Mackey provou que a conjectura é falsa para n maior ou igual a 8. E para n = 7 ?. A resolução, para essa dimensão, veio somente agora em 2020 1.

Figura 2 – O grafo de Keller – Crédito: Wikipédia

Em 1990, Corrádi e Szabó demonstraram que para verificar a conjectura de Keller era necessário e suficiente estudar os grafos de Keller 2.

Seja n a dimensão do espaço que queremos cobrir. Definimos um conjunto {a1,a2 ,…, an} onde as variáveis ai podem assumir qualquer um dos  2s valores inteiros {0,1,2,…,2s-1}. Obviamente, este conjunto conterá (2s)n vértices. Para formar um grafo de Keller, precisamos definir quando dois vértices são adjacentes, isto é, quando eles estão ligados por uma aresta. Dois vértices são adjacentes, se e somente se, eles diferem exatamente de s em pelo menos uma das coordenadas e são diferentes em pelo menos duas coordenadas. Por exemplo, considerando o grafo de Keller G3,2 , os vértices (0 1 2), (0 3 1), (2 3 0) estão todos ligados entre si , enquanto que os vértices (0 1 2),(0 3 2), (0 2 3) não têm nenhuma ligação entre si. Veja a figura 2 para um grafo de Keller  com todas as suas ligações 3.

Um clique de um grafo com um número de vértices igual a V, é um subconjunto com número de vértices V’, V ‘ menor ou igual a V, de tal forma que todos os vértices de V ‘ que compõe o clique estejam ligados entre si.

Na figura 3, V = 6, há cliques com tamanho 3 [(123), (136), (356), …], tamanho 4 [(1236), (1256), (2356), …] e um único clique de tamanho 5 (12356) que é, portanto, o clique máximo.

Já na figura 2, que é o grafo de Keller G2,2, só existem cliques de tamanho 2 (V = 16, V = 2). O clique máximo é, portanto, igual a 2. Na verdade, o clique máximo é igual a 2 para todos os valores de s dos grafos G2,s , s = 1,2,…

Corrádi e Szabó provaram, em 1990, que a conjectura de Keller é falsa se e somente se o clique máximo de Gn,s  tiver o tamanho 2n.

No caso n = 7, Kisielewicz demonstrou que a conjectura de Keller é verdadeira se e somente se não existir, no grafo G7,3 , clique com tamanho 27. E é nesse ponto que entra o trabalho de Brakensiek et al 1. recém publicado. Usando de força bruta computacional eles demonstraram que não existe nenhum clique com tamanho 27 na dimensão n = 7.

Em resumo, a conjectura de Keller é verdadeira para n menor ou igual a 7  e é falsa para n maior ou igual a 8.

Referências:

1 Brakensiek J., Heule M., Mackey J., Narváez D. (2020) The Resolution of Keller’s Conjecture. In: Peltier N., Sofronie-Stokkermans V. (eds) Automated Reasoning. IJCAR 2020. Lecture Notes in Computer Science, vol 12166. Springer, Cham.

https://doi.org/10.1007/978-3-030-51074-9_4

2 https://phys.org/news/2020-10-scientists-year-old-geometry-problem.html

3 https://en.wikipedia.org/wiki/Keller%27s_conjecture

 

*Físico, Professor Sênior do IFSC – USP

(Agradecimento: Sr. Rui Sintra da Assessoria de Comunicação)

Assessoria de Comunicação – IFSC/USP

26 de outubro de 2020

No Large Hadron Collider (CERN) – A formação de vários tipos de Tetraquarks

Por: Prof. Roberto N. Onody*

Os quarks foram previstos em 1964. Existem 6 tipos de quarks (e 6 correspondentes antiquarks): up, down, charm, strange, top e bottom. Eles estão confinados – 3 quarks (ou antiquarks) formam os bárions, como os prótons e nêutrons, 1 quark e 1 antiquark formam os mésons.

O LHC (Large Hadron Collider) no CERN produz colisões de próton-próton de onde emergem e decaem uma grande variedade de partículas. Um dos seus detetores, o LHCb, estuda o méson B (que combina um antiquark bottom e um outro quark). No decaimento do méson B observou-se a formação de vários tipos de tetraquarks – composto por 2 quarks e 2 antiquarks.

Em todos os tetraquarks encontrados até aqui, sempre havia um quark charm e um anticharm, resultando num sabor charm total igual a zero.

Experimentos recentes no LHCb 1 e apresentados num seminário virtual  em 12/08/2020 no CERN, indicam a formação de um tetraquark contendo um único quark charm, mais especificamente, um tetraquark  com os seguintes quarks: um anticharm, um up, um down e um antistrange.

Estudar partículas exóticas como os tetraquarks auxiliam na compreensão das forças fortes e no entendimento da sua própria natureza – serão 4 quarks formando uma única e coesa unidade ou 2 mésons ligados temporariamente?

1 https://phys.org/news/2020-08-open-charm-tetraquark.html

*Físico, Professor Sênior do IFSC – USP

(Agradecimento: Sr. Rui Sintra da Assessoria de Comunicação)

 Figura: Tetraquarks

Crédito: lhcb-public.web.cern.ch/Images2020

Assessoria de Comunicação – IFSC/US

20 de outubro de 2020

Cientistas na descoberta de buracos negros supermassivos

Por: Prof. Roberto N. Onody*

Quasares são objetos astronômicos extremamente brilhantes e muito distantes formados quando o nosso universo era bastante jovem. Em geral, os quasares não são muito maiores do que o sistema solar. Essa pequena extensão, como se fora uma estrela, deu origem ao termo quasar – quase estelar. Hoje sabemos que estes objetos, muito luminosos e energéticos, se encontram no núcleo de galáxias e contêm buracos negros supermassivos.

Recentemente, Onken et al 1 estudaram o quasar J2157 e estimaram a sua massa em 34 bilhões de vezes a massa do Sol. Essa massa implica que o buraco negro tem um raio de Schwarzschild (isto é, o raio do horizonte de eventos) de cerca de 670 Unidades Astronômicas (1 UA é a distância média Terra-Sol). E ele é extremamente voraz. Devora quase a massa de um Sol por dia. Isso o torna, até agora, o buraco negro que mais cresce no Universo. Segundo Onken, se esse buraco negro estivesse no centro da nossa galáxia, ele já teria engolido 2/3 de todas as estrelas da Via Láctea.

As medidas feitas sugerem um valor de redshift entre z = 6,3 a z = 4,692.  Adotando uma cosmologia com o valor da constante de Hubble H0 = 70 km/s-1Mpc-1 , conclui-se que estamos observando o ativo buraco negro quando o Universo tinha entre 860 milhões de anos a 1,25 bilhão de anos de idade. Como gerar um buraco negro com tanta massa e em tão pouco tempo é ainda um quebra-cabeças para os nossos modelos cosmológicos 2.

Existem buracos negros maiores, mas que são, porém, mais velhos. O monstro que reside no quasar TON-618 tem massa estimada de 66 bilhões de massas solares, mas quando o Universo já tinha cerca de 4 bilhões de anos de idade.

O prêmio Nobel de Física de 2020 contemplou a norte-americana Andrea Ghez (a 4ª. mulher a receber o Prêmio Nobel de Física) e o alemão Reinhard Genzel pela descoberta (independente) de um objeto com massa equivalente à de 4 milhões de sóis, invisível, no centro da nossa Via-Láctea,  numa região menor do que o sistema solar. Chegaram a este resultado, pelo estudo das estrelas que orbitam próximo ao centro da nossa galáxia. A explicação atual é a existência de um buraco supermassivo no centro da Via-Láctea. O terceiro ganhador do Prêmio Nobel de Física foi o britânico Roger Penrose,  que introduziu métodos topológicos no estudo da Teoria da Relatividade Geral (proposta por Albert Einstein em 1915) que demonstravam, teoricamente, a existência de buracos negros com origem no colapso de estrelas 3.

Referências:

1 Christopher A OnkenFuyan BianXiaohui FanFeige WangChristian WolfJinyi Yang

Monthly Notices of the Royal Astronomical Society, Volume 496, Issue 2, August 2020, Pages 2309–2314

https://doi.org/10.1093/mnras/staa1635

2 https://www.sciencealert.com/this-absolute-monster-of-a-black-hole-eats-the-equivalent-of-a-sun-a-day

3 http://www.sbfisica.org.br/v1/home/index.php/pt/acontece/1182-penrose-genzel-e-ghez-dividem-o-premio-nobel-de-fisica-2020-por-sua-pesquisa-em-buracos-negros

*Físico, Professor Sênior do IFSC – USP

(Agradecimento: Sr. Rui Sintra da Assessoria de Comunicação)

Figura: Buracos negros supermassivos

Legenda: Primeira imagem de um buraco negro, registrada pelo projeto Event Horizon Telescope. O objeto M87* é um buraco negro supermassivo localizado no centro da galáxia Messier 87.

16 de outubro de 2020

Criando um condensado de Bose-Einstein na Estação Espacial Internacional

Um condensado de Bose-Einstein se forma quando um conjunto de átomos bosônicos (isto é, átomos com spin inteiro) é resfriado até temperaturas próximas do zero absoluto. Confinados em armadilhas magnéticas, esses átomos são conduzidos para o estado de mais baixa energia da armadilha que será, então, um estado quântico altamente degenerado.

Experimentalmente, um condensado de Bose-Einstein é obtido confinando-se átomos bosônicos numa armadilha magnética e utilizando radiação de radiofrequências para eliminar, dessa armadilha, os átomos com maior energia, os mais “quentes”. Os átomos remanescentes colidem entre si até atingirem o equilíbrio térmico. O processo é repetido até que se forme o condensado de Bose-Einstein. Os primeiros condensados de Bose-Einstein foram obtidos em 1995.

Quando se retira o campo magnético em torno do condensado, a nuvem de átomos se expande e, em pouco tempo, a densidade fica muito baixa para a manutenção do condensado. A velocidade de expansão do gás pode ser reduzida diminuindo-se a profundidade do poço magnético.

Na Terra, devido à atração gravitacional são necessários poços magnéticos profundos, mas em ambiente de microgravidade, como na Estação Espacial Internacional, poços rasos são suficientes para a obtenção do condensado de Bose-Einstein.

Utilizando átomos de rubídio, Aveline et al. 1 construíram um condensado de Bose-Einstein aproveitando as facilidades do equipamento de pesquisa, o Cold Atom Lab, colocado a bordo da Estação Espacial Internacional pela NASA em junho de 2018.

Eles verificaram que o tempo de expansão livre do gás, após a remoção do campo magnético, era superior a um segundo. Além disso, devido à ausência de gravidade, a distribuição de átomos na armadilha era uniforme.

Os autores esperam que, tornando rotineira a produção de condensados de Bose-Einstein em ambiente de microgravidade, novos desenvolvimentos em Física de poucos corpos, fontes de laser e interferometria sejam alcançados.

 

Referências:

1 David C. Aveline, Jason R. Williams, Ethan R. Elliott, Chelsea Dutenhoffer, James R. Kellogg , James M. Kohel , Norman E. Lay , Kamal Oudrhiri , Robert F. Shotwell , Nan Yu, Robert J. Thompson,  Nature 582, 193–197 (2020).

https://doi.org/10.1038/s41586-020-2346-1

 

Número de átomos de rubídio em diferentes temperaturas. As áreas nas cores vermelho, amarelo, verde…, azul claro e branco representam átomos com velocidades cada vez menores. Esquerda: Logo antes do aparecimento do condensado de Bose-Einstein. Centro: No instante do aparecimento do condensado. Direita: após a rápida evaporação.

Crédito: Wikipedia

16 de outubro de 2020

Com fótons emaranhados: localização de objetos usando um Radar Quântico

Para localizar um objeto um radar precisa determinar tanto sua distância como a sua direção. Transmite-se uma onda de rádio e analisa-se a onda refletida pelo objeto.

Maccone e Ren 1 propuseram um método que utiliza fótons emaranhados em vez de fótons independentes como na técnica clássica de radar. Eles analisaram todos os graus de liberdade dos fótons emaranhados e como o sinal de rádio se propaga do objeto até a fonte receptora.

Para um sistema com  fótons emaranhados, eles concluíram que o erro na localização do objeto diminui por um fator  ( para cada direção espacial), permitindo, portanto, medidas mais precisas do que o radar clássico na determinação da posição do objeto.

A técnica proposta tem, porém, suas limitações – é muito sensível a ruídos; a perda de um único fóton emaranhado faz com que perca a sua vantagem sobre sistemas clássicos de radar.

Referência:

1 PHYSICAL REVIEW LETTERS 124, 200503 (2020)

 

Crédito: MIT Technology Review

15 de outubro de 2020

Experimento – Flutuação de cabeça para baixo num líquido levitando

Quando colocamos sobre um líquido menos denso um outro mais denso e imiscível, este desce sob a ação da gravidade. A menos que se utilizem técnicas que evitem essa queda como, por exemplo, através de um oscilador vertical.

Foi o que fizeram Apffel et al 1. Eles colocaram óleo de silicone ou glicerol sobre uma camada de ar num vasilhame de acrílico preso a um oscilador vertical, controlando tanto a sua amplitude como a sua frequência de oscilação. Existe um valor máximo da amplitude de oscilação acima do qual a lâmina formada pelo fluido mais denso se desestabiliza. Para evitar o colapso, foi que eles utilizaram fluidos bem viscosos, como óleo de silicone ou glicerol. Com esses cuidados, eles conseguiram fazer levitar uma e até duas camadas de óleo sobre um ou dois colchões de ar (veja vídeo no YouTube 2).

Em seus experimentos, através de uma seringa, eles injetaram ar na lâmina de óleo e a bolha que se formou tanto poderia subir (descer) para a interface superior (inferior). Devido à oscilação, o volume e a pressão do colchão de ar sob a lâmina de óleo variam com o tempo. Supondo o ar um gás ideal num processo isotérmico, além da usual força de empuxo para cima, eles mostraram o surgimento da força de Bjerknes para baixo. Dessa maneira, medindo a partir da interface superior, existe uma profundidade crítica que leva a um comportamento paradoxal: abaixo dela as bolhas sobem, acima dela as bolhas de ar descem.

Continuando a análise teórica, Apffel et al 1 demonstraram que para baixas velocidades do fluido denso e baixas frequências (tipicamente de 60 a 100 Hz) há o surgimento de um novo termo dinâmico que permitirá um equilíbrio estável. Nos seus experimentos, eles colocaram barcos de plástico na interface superior e inferior e observaram que a flutuação e o equilíbrio estável eram os mesmos – tudo se passava como se o sentido da aceleração da gravidade tivesse se invertido – um efeito estranho e contraintuitivo 3.

Referências:

1 Benjamin ApffelFilip NovkoskiAntonin Eddi and Emmanuel Fort. Nature volume 585, pages48–52(2020)

 2 https://www.youtube.com/watch?v=bodsuTucSxQ&feature=youtu.be

3 https://youtu.be/n7UtAR3Tw1Q

Dois barcos idênticos flutuando de maneira estável em líquido levitando

Crédito: Benjamin Apffel et al., Nature.

14 de outubro de 2020

MIT/EUA desenvolve novo processo de produção de Grafeno

O grafeno é uma forma de carbono puro com seus átomos distribuídos numa rede planar hexagonal. Tem excelente propriedades mecânicas e elétricas, é ultrafino e flexível.

Na produção do grafeno se utiliza o processo CVD (Chemical Vapor Deposition) no qual se deposita vapor de carbono sobre uma camada de cobre. O problema maior está em separar o grafeno do seu substrato de cobre. Esse processo de transferência do grafeno tende a produzir rasgos, vincos e defeitos que diminuem drasticamente a condutividade elétrica do material.

Pesquisadores do MIT1 desenvolveram um novo processo de manufatura que consiste em envolver o grafeno (com o seu o substrato de cobre) em uma camada de um material polimérico chamado parileno. Após a delaminação, obtém-se uma folha de grafeno ultrafina (menos de um nanômetro), flexível e transparente.

Para testar o grafeno assim produzido, o grupo do MIT estudou uma célula solar com o filme de grafeno em um dos eletrodos. A transmitância ótica medida foi de 90% sob luz visível.

O material padrão utilizado, hoje em dia, em células solares é o ITO (Óxido de estanho e Índio), um material feito com elementos raros e caros. Quando comparados, a célula solar baseada no grafeno transmitiu 36 vezes mais potência por peso do que aquela utilizando ITO. Outra vantagem fundamental é que, ao contrário do ITO, o grafeno vem praticamente de graça2.

Referências:

 1 Mohammad Mahdi Tavakoli, Giovanni Azzellino, Marek Hempel , Ang‐Yu Lu, Francisco J. Martin‐Martinez, Jiayuan Zhao, Jingjie Yeo, Tomas Palacios, Markus J. Buehler, , Advanced Functional Materials;  https://doi.org/10.1002/adfm.202001924

2 David L. Chandler, MIT News Office

 

Crédito: Livre

13 de outubro de 2020

JAG21 – Uma potente droga contra a Malária e a Toxoplasmose

Por: Roberto N. Onody*

A malária é causada pelo parasita Plasmodium e transmitida, principalmente, por picadas de mosquitos infectados. Os sintomas em seres humanos são parecidos com o de uma gripe. Seu efeito é devastador, matando cerca de 500.000 de crianças por ano, uma a cada 11 segundos, principalmente na África subsaariana. Segundo o cientista Robert Pru’homme, da Universidade de Princeton, “Muito embora, nas últimas décadas, tenham sido desenvolvidos medicamentos no combate à malária, eles vêm perdendo eficiência à medida que os parasitas desenvolvem resistência a eles – é uma batalha constante”.

Já a toxoplasmose é causada pelo protozoário Toxoplasma gondii. É geralmente transmitida por alimentos mal cozidos com quistos do parasita, fezes de gatos infectados ou pela mãe durante a gravidez.  Infecções severas de toxoplasmose causam danos ao cérebro e aos olhos, principalmente em pessoas com o sistema imune comprometido, como as em tratamento de câncer ou com AIDS. Acredita-se que o parasita esteja presente, de forma assintomática, em dois bilhões de seres humanos!

Uma equipe internacional 1 obteve uma nova droga tetrahydroquilonone – chamada de JAG21 – que se mostrou muito eficiente contra os dois parasitas. O JAG21 tem como alvo uma molécula que é fundamental para a sobrevivência dos dois parasitas. No estudo feito em laboratório com ratos infectados com malária, todos se recuperaram com uma única e pequena dose do JAG21. Contra a toxoplasmose a droga erradicou 100% da forma ativa do Toxoplasma gondii e 95% da forma inativa de cistos.

Para iniciar testes em seres humanos, a droga que tem que ser reduzida em tamanho a partir de um grande cristal 2. Pesquisadores das Universidades de Leeds e de Chicago tentaram solventes químicos para reduzir o cristal a pequenas partículas. Infelizmente essas partículas não metabolizaram bem o suficiente para entrar na corrente sanguínea. O grupo de Princeton, liderado por Robert Pru’homme, conseguiu quebrar a droga em pequenos cristais usando vibrações ultrassônicas para produzir uma mistura uniforme e solúvel em água. Com esse tratamento, a droga se revelou estável (isto é, não se recristalizou) por seis meses quando mantida à temperatura ambiente. Num próximo passo, o grupo de Princeton pretende transformá-la em nanopartículas para que possa ser entregue como um spray nasal.

Quando este medicamento vier a ser comercializado será concorrente da hidrocloroquina. Só espero que esta nova droga não seja utilizada, sem estudos clínicos comprovados cientificamente, em infecções como a do COVID-19.

Referências:

1 Martin J. McPhillie et al., Front. Cell. Infect. Microbiol., 17 June 2020 https://doi.org/10.3389/fcimb.2020.00203

2 https://medicalxpress.com/news/2020-09-drug-powerful-weapon-malaria-toxoplasmosis.html

 

*Físico, Professor Sênior do IFSC – USP

Figura: Uma potente droga contra a Malária e a Toxoplasmose

Crédito: David Ferguson, Oxford University

(Agradecimento: Sr. Rui Sintra da Assessoria de Comunicação)

13 de outubro de 2020

Abelhas podem fazer as plantas florescerem antes do previsto

Mudanças climáticas podem comprometer o delicado equilíbrio e a sincronização entre os polinizadores e as flores. Enquanto o desabrochar das flores depende fortemente do período de exposição das plantas à luz, o surgimento de insetos polinizadores é principalmente controlado pela temperatura ambiente.

As plantas, em troca do serviço de polinização, fornecem alimento aos insetos que visitam suas flores. O pólen é a única fonte de proteínas das abelhas e, portanto, um atraso no desabrochar das flores, as deixará morrendo de fome.

Mas a natureza sempre procura um caminho de preservar a vida. Um estudo desenvolvido por Pashalidou et al. 1 concluiu que as abelhas podem manipular as plantas de uma horta para acelerar o surgimento de suas flores.

Trabalhando com as abelhas Bombus Terrestris, tanto em condições de laboratório como ao ar livre, Pashalidou et al encontraram um comportamento bem diferente e peculiar entre as colônias bem ou mal alimentadas – as mal alimentadas faziam vários furos nas folhas das plantas para acelerar a sua floração. Por exemplo, para a mostarda preta (Brassica nigra) que teve suas folhas perfuradas houve florescimento antecipado em duas semanas, ao passo que o tomate (Solanum lycopersicum) floresceu um mês antes do que o esperado.

Mas, como surgiu este comportamento? Poderiam essas abelhas estarem marcando as plantas para buscarem sua recompensa daqui há um mês? Sabe-se que essa espécie de abelha tem memória geográfica que pode durar sua vida inteira, mas, ao ar livre, raramente ela vive mais do que um mês. Pelo curto tempo de contacto da abelha ‘mordendo’ a folha, Pashalidou et al também descartaram a possibilidade de ela sorver a seiva da planta – que seria uma recompensa individual imediata.

Do ponto de vista da planta, seria a antecipação da sua floração uma resposta ao ataque das abelhas? Mas perfurações mecânicas, feitas com objetos metálicos, não induziram ao florescimento antecipado. Uma possibilidade é que as abelhas injetem alguma substância química que promova a floração precoce. Se assim for, o conhecimento dessa substância e do seu mecanismo de ação seria o sonho de todo horticultor 2.

Referências:

1 F. G. Pashalidou, H. Lambert, T. Peybernes, M. C. Mescher, C. M. De Moraes, Science 368, 881 (2020).

2 L. Chittka, Science 368, 824 (2020).

A abelha Bombus terrestris perfurando folha para antecipar floração

Crédito: Hannier Pulido/ De Moraes and Mescher Laboratories

9 de outubro de 2020

Através do telescópio “eROSITA” – O Universo em raios-x

O telescópio eROSITA, a bordo da nave russo-alemã SGR (Spectrum-Roentgen-Gamma), fez imagens em raios-x do universo e encontrou dez vezes mais fontes de raios-x do que o telescópio ROSAT obteve há 30 anos atrás. A nave SGR orbita o ponto de Lagrange 2 do sistema Terra-Sol e foi lançada em 2019. O mapa feito pelo telescópio eROSITA identificou cerca de um milhão de objetos, praticamente dobrando o número de fontes conhecidas em 60 anos da história da Astronomia de raios-x.

Durante seis meses, o telescópio eROSITA1,2 escaneou o céu medindo a energia dos fótons coletados com uma precisão de 2% a 6%. Para gerar a imagem (veja abaixo), todo o céu é projetado numa elipse (a assim chamada projeção de Aitoff). O centro da Via Láctea está no meio da figura e o seu corpo está ao longo do eixo horizontal. Os fótons foram codificados por cores de acordo com sua energia – vermelho para energias entre 0,3 – 0,6 keV, verde para 0,6 – 1,0 keV e azul para 1 – 2,3 keV.

O mapa revela a presença de estrelas de nêutron, buracos negros, anãs brancas e restos de supernovas em nossa própria galáxia e em galáxias vizinhas como as Nuvens de Magalhães. Longe da nossa vizinhança, o telescópio eROSITA identificou núcleos ativos de galáxias, buracos negros supermassivos e aglomerados de galáxias que aparecem como extensos halos de raios-x, bastante brilhantes devido a gases extremamente quentes e confinados graças à grande concentração de matéria escura. o telescópio eROSITA detectou também súbitas explosões da raios-x com origem na fusão de estrelas de nêutron ou de estrelas sendo engolidas por buracos negros.

Referências:

1 http://www.mpe.mpg.de/7461761/news20200619

2 https://www.sciencemag.org/news/2020/06/what-our-universe-looks-x-ray-eyes

 

Crédito: Jeremy Sanders, Hermann Brunner, Andrea Merloni and the eSASS team (MPE); Eugene Churazov, Marat Gilfanov

8 de outubro de 2020

Starlink: conflito entre tecnologia e ciência básica?

A Starlink1 é uma constelação de satélites construídos pela empresa SpaceX administrada pelo bilionário Elon Musk. O seu objetivo é prover internet de alta velocidade para todo o planeta e, em particular, para locais de difícil acesso. A Starlink (com seus satélites situados a uma altitude de, no máximo, 1.325 quilômetros da superfície da Terra) foi projetada para operar com velocidade de até 1 Gb/s (claro, a velocidade real dependerá do número de usuários conectados) e, além disso, o seu tempo de latência é da ordem de 20 milissegundos bem menor do que os 500 milissegundos da banda doméstica atual, cujos satélites estão em órbita geoestacionária a cerca de 35.000 km da superfície da Terra2.

A agência de telecomunicações FCC (Federal Communications Commission) dos EUA aprovou a operação de 12.000 satélites. Esses satélites são pequenos, com peso variando de 227 a 260 kg e em baixa órbita, com altitude variando de 336 a 1.325 km. Os primeiros satélites foram lançados em fevereiro de 2018 e, até setembro de 2020, foram colocados 712 em órbita.

Esses satélites são lançados pelos foguetes Falcon 9, também fabricados pela SpaceX, e são bastante econômicos pois reutilizam os propulsores do primeiro estágio. O foguete Falcon 9 foi o que lançou a cápsula Crew Dragon, com dois astronautas a bordo, e que se conectou recentemente à Estação Espacial Internacional, quebrando um jejum norte-americano de 9 anos sem vôo tripulado (desde a aposentadoria dos Ônibus Espaciais). Neste intervalo de tempo, os EUA utilizaram a nave Soyuz, lançada a partir da base soviética de Baikonur no Cazaquistão. A SpaceX tem um contrato de US$ 2,6 bilhões com a NASA para a construção de cápsulas e foguetes com destino à Estação Espacial Internacional. Os satélites da rede Starlink têm propulsão iônica podendo manobrar no espaço e mudar de órbita. Na outra ponta, o assinante da rede deverá ter, na sua casa, terminais semelhantes aos nossos roteadores, mas que necessitam ter visibilidade do céu. E, sim, os satélites, por terem órbita baixa, podem ser vistos a olho nu aqui da Terra.

Recentemente, a SpaceX solicitou autorização para lançar outros 30.000 satélites. E é aí que começam os problemas entre a iniciativa privada e a ciência básica3. Em uma contagem recente, a NASA estimou um total de 5.000 objetos (ativos e inativos). Obviamente, tal pletora de objetos espaciais prejudica as observações astronômicas. Em 20 de novembro de 2019, o telescópio Blanco, instalado no Chile, gravou imagens com o surgimento de 19 linhas brancas associadas ao trânsito de um trem de satélites Starlink lançados na semana anterior. O reflexo e o brilho dos satélites foram medidos pelo Observatório Las Cumbres, uma rede global de pequenos telescópios. No crepúsculo e quando os satélites se encontram baixo no horizonte são os momentos que eles têm maior brilho. Ele diminui significativamente quando se eleva a altitude do satélite para 550 km ou mais. Longos tempos de exposição e espelhos grandes tornam ainda mais vulnerável o telescópio. É o caso do Observatório Rubin que tem um espelho de 8,4 m, tempos de exposição da ordem de 30 segundos e que deverá ser colocado em funcionamento em 2022. Há estimativas de que cerca de 1/3 das imagens do Observatório Rubin seriam prejudicadas pela constelação Starlink.

Para solucionar este grave problema, o coordenador do Observatório Rubin e sua equipe têm mantido contatos semanais com engenheiros da Starlink. As soluções propostas até aqui incluem aumentar a altitude das órbitas dos satélites e escurecê-los, diminuindo seus reflexos por um fator de 15 vezes. Elon Musk declarou estar completamente comprometido com a solução do problema e promete lançar os próximos satélites já dotados das medidas anti-reflexo.

O projeto Kuiper da Amazon pretende lançar 3.326 satélites (já autorizados) para ampliar a cobertura de internet, à semelhança da SpaceX. A Amazon também se comprometeu a levar em conta a refletividade de seus satélites.

E esse parece ser o melhor caminho – um diálogo entre a tecnologia e a ciência básica para que ambas possam progredir, sentando-se à mesa e resolvendo pontualmente seus conflitos. Acredito que a criação de um órgão regulatório internacional, seria um foro ideal para a solução de conflitos.

Referências:

1 https://www.starlink.com/

2 https://olhardigital.com.br/ciencia-e-espaco/noticia/saiba-tudo-sobre-o-projeto-starlink/101788

3 https://www.sciencemag.org/news/2020/02/tens-thousands-communications-satellites-could-spoil-view-giant-sky-telescope

Rastros deixados pelos satélites da Starlink em fotografias de
longa exposição

Crédito: Observatory images. VICTORIA GIRGIS/LOWELL OBSERVATORY

(Prof. Roberto Onody)

Assessoria de Comunicação – IFSC/USP

25 de setembro de 2020

Nova interface da Google

A Google sempre foi muito criativa e original no desenvolvimento de interfaces para usuários de smartfones – desde jaquetas sensíveis ao toque ao controle de presença e gestos via um chip de radar em celulares.

Agora, a Google experimenta um fone de ouvido cuja interface com o celular é uma “trança inteligente” – fios condutores e capacitivos são trançados formando uma espécie de cordão que controla a entrada e saída de dispositivos. Daí o seu nome “I/O Braid”.

Essa trança registra comandos do usuário e distingue ações como tocar, apertar, esticar e torcer. Voluntários interagiram com a trança e a coleta de seus dados de pressão, área de toque, torção e duração do contacto foram analisados por um programa de Inteligência Artificial. Segundo a Google, a precisão no reconhecimento dos gestos chegou a 94%. Para um retorno visual do toque, foi inserida uma fibra ótica na trança. Em um estudo realizado, usuários disseram que o “I/O Braid” era mais fácil de usar e mais rápido do que o cabo tradicional com botões de controle.

Referência:

https://www.youtube.com/watch?v=t-_QCI8ntDM

 

Crédito: Alex Olwal (Google)

 

 

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