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30 de agosto de 2013

Por que em breve poderemos falar com o computador?

Por mais de uma década, o docente do IFSC-USP, Prof. Dr. Osvaldo Novais de Oliveira Jr., tem dado palestras tentando explicar o porquê de autores de ficção científica terem errado tão grosseiramente nas previsões de comunicação dodigitalWorld homem com a máquina.

De fato, em filmes e livros de ficção dos anos 1960-1970 era comum haver robôs que se comunicavam sem dificuldade com os humanos e, como sabemos, isso está muito longe de ocorrer.

Segundo este cientista, são várias as razões para que esses erros de previsão tenham ocorrido, mas talvez a mais importante tenha sido o não reconhecimento da complexidade da linguagem humana, e a necessidade do chamado “conhecimento de mundo” para uma comunicação eficaz. Mesmo crianças, em fase de aprendizado da língua, já detêm um volume gigantesco de informações e estratégias, que hoje parecem impossíveis de processar por um computador.

Nas palestras proferidas por Osvaldo Jr., ele sempre menciona as duas abordagens de processamento automático de línguas naturais (PLN), a simbólica e a estatística (ou conexionista e agora também chamada de baseada em corpus ou em aprendizado de máquina).

Para uma audiência de não especialistas, é fácil explicar os requisitos de um sistema de processamento no paradigma simbólico, o que inclui dicionários, analisadores sintáticos e semânticos: Minha ênfase – até porque é fácil de a audiência perceber – é sempre voltada para a dificuldade de resolver ambiguidades, principalmente nos casos em que conhecimento de mundo é necessário. Dou exemplo de sentenças que mesmo humanos não conseguem decifrar, a menos que tenham experiência de uma cultura local, e para tanto uso sentenças em inglês cuja compreensão requer conhecimento da cultura britânica. Se houver membros na audiência com tal experiência as sentenças são facilmente decifráveis, e não havendo preciso dar pistas para que a audiência adivinhe o significado. Em ambos os casos, a dificuldade de interpretação por um computador fica claramente demonstrada, refere o pesquisador.

Contudo, na opinião de Osvaldo, chegou a hora de reconhecer que ele próprio estava enganado e, segundo suas próprias palavras, infelizmente não informou suas audiências corretamente por todos esses anos ao se fixar nas dificuldades de processamento, dando a entender que dificilmente o homem se comunicaria com a máquina de forma natural: Meu IBM_-_JEOPARDYprimeiro erro foi não ter a percepção de que o outro paradigma de PLN, que hoje se apoia nos métodos de aprendizado de máquina, pode dar resultados muito superiores aos do paradigma simbólico, o que já acontece nos tradutores automáticos. Mas o erro crucial foi não compreender que o aprendizado de máquina mimetiza – ainda que de maneira rudimentar – o aprendizado humano. Portanto, quando a capacidade de processamento da máquina se equiparar à dos humanos, os sistemas computacionais devem apresentar habilidades semelhantes na produção e recepção de uma língua, talvez com menor eficiência (será?). Minha opinião sobre os limites do PLN mudou drasticamente em 2011, quando o computador Watson, da IBM, venceu campeões humanos na competição Jeopardy – um programa de perguntas e respostas de conhecimentos gerais da TV americana. Agora prevejo um progresso tão espetacular que permitirá comunicação com computadores num futuro não muito distante, desde que a capacidade de processamento de um computador continue aumentando com taxas semelhantes às atuais (no que é chamado de Lei de Moore), adianta o pesquisador.

PLN baseado em aprendizado de máquina

Neste paradigma de PLN, métodos computacionais de aprendizado de máquina são empregados para aquisição de conhecimento a partir de grandes corpora, ou seja, a partir de exemplos. A eficiência do paradigma ficou clara nos últimos anos, à medida que o armazenamento de grandes volumes de informação lingüística passou a ser praticamente ilimitado, com todo o material hoje disponível em meio eletrônico. Para tradução automática, por exemplo, foram necessários corpora volumosos de textos alinhados para as línguas em questão. Na competição Jeopardy, mencionada acima, o supercomputador Watson foi projetado especificamente para a tarefa de perguntas e respostas, com capacidade de processar cerca de um milhão de livros por segundo, e com acesso a grande parte do material disponível em meio eletrônico, em língua inglesa.

Pode-se agora antever novos desdobramentos que revolucionarão os sistemas de busca na Internet e aplicativos similares. Para dar um exemplo simples, imagine que todos os objetos de certo domínio sejam definidos numa enciclopédia. Para o sistema computacional será fácil responder a qualquer pergunta do tipo “O que é ….?” Exemplo semelhante, talvez um pouco mais difícil, será responder a perguntas do tipo “Quem fez ….?” ou “Quem foi …?”, a partir de bases de dados.

Computador ou máquina personalizada

Para justificar algumas das previsões e o otimismo de Osvaldo Novais de Oliveira Jr. com o PLN baseado em aprendizado de máquina, o cientista discute como as máquinas, no PLNfuturo, poderão ser diferentes das de hoje: Quando compramos um computador, o hardware vem acompanhado de uma série de softwares, sendo o principal o sistema operacional. Além disso, muitos programas já vêm instalados, de maneira que cada máquina já tenha dezenas ou centenas de programas. Uma característica interessante é que as máquinas são quase iguais para todos. Há, obviamente, uma particularização da língua natural para comunicação com o usuário, há diferentes sistemas operacionais e algumas outras especificidades. Mas só. Prevejo que, em décadas, os usuários acharão bizarro que todos tenhamos computadores quase iguais, “sem personalidade”, e com um número pequeno de programas. Para esses usuários do futuro, que receberão um computador com milhões ou bilhões de programas, será difícil imaginar o nosso tempo, assim como os jovens agora se divertem em saber que já usamos computador sem disco rígido, pontua Osvaldo.

Em suma, o computador, no futuro, já terá muito mais conhecimento embutido e provavelmente contará com estratégias que permitam aumentar esse conhecimento automaticamente com aprendizado de máquina. Hoje, o acréscimo é muito tímido, a partir da instalação, pelo usuário, de programas, bibliotecas e funcionalidades. Tudo em pequena escala e de forma manual.

A possibilidade de aprendizado contínuo do computador suscita a necessidade de independência, para que a aquisição de informação (ou conhecimento?) se dê sem intervenção de um humano. Isso já seria possível, atualmente, com hardware específico e mobilidade da máquina, como um robô. Podemos imaginar a máquina funcionando com bateria recarregável, que buscará fonte de energia quando necessário. Imagina-se, também, um robô dotado de visão e uma série de sensores que permitam sentir e avaliar o ambiente.

A decisão, ou “desejo”, de adquirir novos conhecimentos – da Internet, de algum repositório ou de outras máquinas – será dada pelo programa que gerencia as ações da máquina. Como, obviamente, o programa foi escrito por um humano, aparentemente a máquina não tem independência.

Mas a dependência pode ficar invisível quando não mais for possível descobrir qual dos milhões de programas que vieram com o computador é responsável pelo gerenciamento geral. Ou mesmo, se tal programa não foi – ele próprio – produzido por outra máquina, a partir de modificações de um programa originalmente escrito por humanos.

A educação de uma máquina

Este é um ponto interessante, devido à analogia com educação de crianças numa sociedade. Mesmo considerando que cada máquina já poderá vir personalizada a partir das escolhas do comprador, o que ela aprenderá vai depender das instruções do dono e do ambiente. Se o dono usar duas ou mais línguas, por exemplo, a máquina adquirirá conhecimento nessas línguas.

Digital-WorldPara um dono que trabalha no mercado financeiro, a máquina deverá se tornar especialista em estatística, ações, câmbio e acompanhar todo o noticiário de negócios: Imagino que a máquina possa ser auxiliar, cuidando dos diversos assuntos que o dono definir. Pode fazer gerenciamento de contas bancárias, cuidar da agenda do dono, preparar material de suporte para o trabalho do dono, etc. Por exemplo, fazer pesquisa na literatura e preparar material didático para um dono que exerça a atividade de professor. Obviamente, para realizar a maioria das tarefas estou supondo que a Internet será acessível para as máquinas, o que ainda não é possível. Mas, há propostas nesse sentido, como a Web Semântica, comenta Osvaldo.

Gestação de uma máquina

Para o pesquisador do IFSC, a aquisição de uma máquina será um processo muito mais complicado do que é comprar um computador hoje. Para personalizar a máquina (robô) há que se decidir como selecionar os milhões ou bilhões de programas e aplicativos, o que deverá levar muito mais tempo e, provavelmente, terá que ser feito com apoio de uma (outra) máquina.

Não se pode esperar que um humano vá saber em detalhe o que selecionar. É esta dificuldade de identificar a origem das decisões que dá o aspecto de independência para as máquinas. Elas parecerão ter vontade própria, simplesmente porque não saberemos explicar como as decisões são tomadas. Neste contexto, reparar uma máquina avariada – ou que simplesmente esteja se comportando de maneira inesperada – será muito mais complicado, pois o cenário é completamente distinto do atual em que um humano especialista localiza o problema, conserta ou substitui um componente (programa ou elemento de hardware).

Aqui surge uma possibilidade interessante: Suponhamos um casal recém-casado, cada qual com seu agente (robô ou só agente de software). Esses agentes terão sido treinados de acordo com os gostos e necessidades dos donos. CHU10Ao iniciar a nova vida juntos, o casal percebe que seria mais eficiente conciliar agendas e aplicativos, e decide adquirir uma nova máquina (novo agente). Para selecionar a especificação inicial, como mencionado acima, e posteriormente treinar a nova máquina, será necessária a atuação conjunta das máquinas do casal. Ou seja, a nova máquina herdará características da máquina do marido – chamemos máquina-pai – e da esposa, a máquina-mãe. Seria como receber o código genético dos pais (máquinas neste caso); a propósito a metáfora que deu origem aos algoritmos genéticos provavelmente já estará sendo usada para a herança de características. Incompatibilidades poderão aparecer na junção dessas características, e imagino que devamos esperar que a máquina-filha seja diferente das que lhe deram origem, apesar da herança. Fenômenos como mutações poderão ocorrer, de maneira muito semelhante ao que acontece em biologia. E o que é mais relevante: quando quisermos descobrir a razão para certos comportamentos da máquina, como abordagens para resolver problemas ou como decisões são tomadas, pode não ser fácil determinar a origem. O comportamento pode ter sido adquirido das máquinas-pais ou aprendido no processo de aquisição de conhecimento da nova máquina, esclarece o pesquisador.

Máquina pode ter sentimento?

Um argumento comum daqueles que não acreditam que o computador pode superar o humano é de que uma máquina jamais terá sentimento. Parece verdade. Mas o que é sentimento? Como se sabe que as pessoas têm sentimento? Ora, sabemos que elas têm sentimento por sua reação ao interagir conosco. Usando essa definição de “sentimento”, ou seja, o que é inferido por nossa percepção de uma reação da pessoa, o pesquisador do IFSC acredita que as máquinas podem ter sentimento.

As reações das máquinas atuais são muito artificiais e facilmente descobrimos que se devem a estímulos previamente programados por humanos. Mas, e quando não for possível determinar a origem das decisões das máquinas? E se estas usarem uma lógica fuzzy para alguns tipos de decisão, dando a impressão de serem irascíveis? Quando as reações das máquinas puderem ser muito variadas e não formos capazes de compreender sua origem, atribuiremos a elas sentimentos!

A máquina então passará no teste de Turing, sem que consigamos distinguir sua reação da de um humano.

Assessoria de Comunicação

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Instituto de Física de São Carlos - IFSC Universidade de São Paulo - USP
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