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27 de abril de 2012

Nova vacina mais eficiente e indolor dá primeiros passos

Os caminhos para cura da leishmaniose, doença crônica causada por protozoários, e que atinge mais de 2 milhões de pessoas anualmente em todo globo, é trabalhoso e exige uma grande esforço dos estudiosos que se dedicam a essa busca.

Izaltina-3Mas, no Grupo de Cristalografia (GC) do Instituto de Física de São Carlos (IFSC/USP), pode-se dizer que, no que se refere à pesquisa básica (primeiro passo em direção ao tratamento), metade do caminho já foi percorrido. Mas, para entender o percurso, o melhor é escrevê-lo em detalhes.

A técnica chave para destruir o parasita em questão, no laboratório da Cristalografia, é a chamada “metagenômica”. O intuito final é a produção de um fármaco mais eficiente e com menos efeitos colaterais às vítimas da doença. “Muitos pesquisadores utilizam derivados de plantas e animais na busca de novos princípios ativos para o desenvolvimento de fármacos contra a doença. Mas, os medicamentos usados exigem um tratamento muito longo, são injetados no músculo ou na veia dos pacientes, dependendo do medicamento, ou seja, muito doloridos, além do forte efeito colateral que causam”, explica Izaltina Silva Jardim, pesquisadora e pós-doutoranda do GC do IFSC/USP.

Mesmo assim, alguns casos são recidivos, ou seja, o paciente fica “curado” por um tempo e, depois, a doença volta. É quando entra a técnica metagenômica, que trabalha, fundamentalmente, com bactérias ambientais, que não são cultiváveis em laboratório. Fazendo-se uma comparação com a descoberta da penicilina, onde o potencial da substância de um fungo foi descoberto ao acaso e revolucionou a medicina, se aposta nas bactérias ambientais e nas substâncias que elas produzem para trazer, como consequência, a cura da leishmaniose.

O começo do processo se dá pela coleta de amostras de solo que, por sua vez, abrigam inúmeros tipos de micro-organismos desconhecidos. Esses micro-organismos não podem ser cultivados em laboratório e por isso o seu DNA é isolado.

Na amostra de terra, os diversos micro-organismos presentes (que podem ser bactérias, fungos etc.) têm seu DNA extraído (direto da amostra). Através de enzimas de restrição, ele (DNA) é fragmentado (cortado em pedaços) e, finalmente, ligado a um vetor (cosmídeo). Resumindo, um pedaço de DNA do micro-organismo será inserido no cosmídeo, formando um plasmídeo recombinante. Esse recombinante é colocado em outra bactéria (E. Coli), esta, por sua vez, possível de ser cultivada em laboratório.

Tal procedimento é feito diversas vezes, com vários micro-organismos encontrados na amostra recolhida (aquela do comecinho do procedimento), o que resultará na chamada “Biblioteca metagenômica”. “Uma das bibliotecas que eu testei, contém 300 mil fragmentos de DNA diferentes e outra, que começaremos a testar agora, tem 500 mil fragmentos de DNA dos micro-organismos encontrados em uma amostra”, conta Izaltina.

Depois que a E. Coli recebe plasmídeo recombinante, ela é plaqueada (colocada na placa de Petri para crescer), os parasitas causadores da leishmaniose são plaqueados por cima das bactérias cultivadas, gerando uma co-cultura de bactérias e parasitas.

Algum tempo depois, reações físicas entre eles serão observadas: onde a bactéria tiver produzido uma substância que mata a leishmania, tem-se um candidato à produção de fármaco. “Ao redor da bactéria que matou a leishmania, podemos observar uma região mais translúcida”.

Todos os procedimentos descritos até agora já foram feito por Izaltina e outros pesquisadores da USP. A fase que se inicia é análise das substâncias produzidas pela E. Coli que foi capaz de matar a leishmania.

Tiros no escuro

Toda análise, além de trabalhosa (como dá a impressão) é, também, demorada. Um ano é o tempo médio para formar a Biblioteca Metagenômica, mas a colaboração entre pesquisadores catalisa o processo. Explicamos.

Na Biblioteca de 300 mil clones (fragmentos de DNA) analisada por Izaltina e construída pela docente, Mônica Tallarico Pupo, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto (FCFRP/USP), 35 clones foram capazes de matar a leishmania. No entanto, devido a algumas interferências (como a bactéria ter crescido sob uma situação de estresse), pode ser que ocorram equívocos em relação a sua eficiência em matar o parasita.

No entanto, em colaboração com pesquisadores da UFPR em Curitiba, Izaltina teve acesso à outra Biblioteca metagenômica (cedida pelo Dr. Emanuel Maltempi de Souza), onde encontrou 192 clones de amostras de micro-organismo de solo da Mata Atlântica e outras regiões, já isolados, mas dessa vez em meio líquido. “Mudamos, então, nossa técnica. Em vez de plaquear as bactérias e esperá-las crescer e depois plaquear a leishmania por cima, fizemos diferente. Pegamos os clones e deixamos crescer em meio líquido. Durante seu crescimento, a bactéria produz substâncias e as joga no meio. Esperamos cinco dias e depois separamos o líquido das bactérias e o colocamos na cultura de leishmania”.

IzaltinaO resultado foi muito mais animador. Dos 192 clones, 13 deram ótima atividade, ou seja, depois de testado e re-testado, cerca de 50% das leishmanias foram mortas pelas substâncias produzidas pelas bactérias e misturadas ao líquido.

O próximo passo é, justamente, isolar todas as substâncias encontradas no líquido, para descobrir qual delas é a responsável pela morte da leishmania. “Quando isolamos essas substâncias, temos que isolar suas estruturas químicas e aí, então, poderemos saber de ‘quem’ se trata”, afirma Izaltina.

Fora isso, o DNA dos 13 clones positivos será sequenciado. “Nesse sequenciamento, podemos, às vezes, identificar de qual tipo de bactéria veio a substância para chegarmos a um produto único, que poderá ser usado como remédio”.

Nova cura para uma velha doença

Todos os passos descritos do início dessa matéria até esta linha referem-se, integralmente, à pesquisa básica. A aplicação disso tudo que, numa linguagem mais simples, seria a produção de um fármaco, pode demorar alguns anos. “A substância, candidata ao fármaco, deve matar a leishmania, mas sem afetar as células humanas”, explica Izaltina.

Portanto, ainda in vitro, testes são feitos com células saudáveis e infectadas de camundongos, depois disso com células humanas saudáveis e infectadas (paralelamente fazendo testes de toxicidade, farmacológicos etc.) com a substância. Considerando que todas as etapas tenham sido bem-sucedidas e contando com aprovação de comitês de ética e agências de vigilância sanitária, iniciam-se os testes com humanos. “Começando por pacientes saudáveis e tendo observado que não houve efeitos colaterais nem reações negativas, passa-se aos pacientes infectados: primeiro grupos pequenos, depois grupos maiores. Tudo isso leva, em média, dez anos”, conta.

Izaltina-1Se parece desanimador esperar tanto tempo pela fabricação de um fármaco para cura mais rápida, indolor e “confortável” da leishmaniose, a penicilina, contando com muita sorte, só passou a ser produzida 12 anos após a descoberta do fungo que a produz. Para saber se a pesquisa valeu a pena, pergunte a qualquer pessoa que já tomou antibiótico (vale, até, perguntar a si mesmo). “Até o final deste ano, nosso plano é chegar até, pelo menos, a fase dos testes in vitro“, torce Izaltina.

Depois disso, bastam alguns anos para termos nas prateleiras das farmácias mais um produto “milagroso”, resultado do esforço e paciência dos dedicados pesquisadores.

Assessoria de Comunicação

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Instituto de Física de São Carlos - IFSC Universidade de São Paulo - USP
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