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18 de março de 2013

A terceira tecnologia computacional

Cada dia mais notória, especialmente no mundo acadêmico, a Computação Quântica tem se tornado “figurinha conhecida” para muitos pesquisadores. Vista como uma possível tecnologia com potencial para dominar o funcionamento da telecomunicação mundial, ela funciona de maneira diferente da computação clássica e promete deixar muito mais rápido o processamento de informações, inclusive nos computadores pessoais que usamos cotidianamente.

No entanto, uma “variável” da computação quântica começa a entrar em cena: a computação quântica adiabática. Mais desconhecida (pelo menos por enquanto), ela começa a chamar atenção de alguns pesquisadores. Porém, para entender a principal diferença entre os tipos de computação com que trabalhamos, e com as quais eventualmente poderemos trabalhar no futuro, são necessários alguns esclarecimentos prévios.

Mundo clássico, mundo quânticoFrederico-adiabtica

As propostas iniciais da computação quântica foram baseadas na analogia com o que já existe, ou seja, a linguagem da computação clássica, que tem como “idioma” a linguagem binária, baseada em zeros e uns, conhecida como “modelo de circuito”. Para realizar tarefas computacionais no mundo clássico, portanto, as informações são descritas por um novo “alfabeto”. Por exemplo: a combinação 000000 corresponde ao número zero, a combinação 1000001, corresponde à letra A, e assim por diante. As informações, portanto, são armazenadas dessa forma e, posteriormente, manipuladas para executar as mais diversas tarefas, como, por exemplo, cálculos em planilhas, produção de textos etc. Tudo isso já é feito com perfeição pelos computadores clássicos através dos algoritmos, definidos como um conjunto de tarefas realizadas para se obter o resultado daquilo que foi solicitado ao computador, geralmente pelo próprio usuário.

O computador clássico é, também, universal, pois é capaz de realizar muitas tarefas diferentes (cálculos, edição de textos e imagens, execução de games e vídeos etc.). “Os PCs não são especializados em tarefas específicas, mas universais. No entanto, algumas realizadas nesse tipo computador demorarão muito mais tempo do que se fossem feitas em outro computador diferente, com a ‘lógica quântica'”, exemplifica o docente do Grupo de Física Teórica do Instituto de Física de São Carlos (IFSC/USP), Frederico Borges de Brito.

No entanto, na década de 80, uma questão veio à tona: seria possível utilizar–se integralmente da lógica quântica para realizar tarefas que a clássica tem dificuldades em cumprir?

Tal reflexão foi feita quando físicos tentavam simular a matéria, ou seja, num momento propício para tirar a dúvida acima. Foi quando eles perceberam que simular matéria quântica utilizando-se de um computador clássico era inviável. “Os físicos perceberam, então, que era preciso simular a mecânica quântica nos computadores. Nesse momento, eles seguiram a mesma analogia do caso clássico, criando o ‘alfabeto’ da comunicação quântica e um novo sistema de processar, manipular e armazenar informações”, conta Frederico.

Spin, polarização, supercondutores etc. são elementos que, hoje, fazem parte do “regime quântico”. Uma nova codificação para computação quântica, e uma nova linguagem (os Qubits), nascia, seguindo as ideias análogas à computação clássica e nascia uma nova tecnologia.

Mundo quântico, mundo quântico adiabático

Depois de criar uma nova linguagem para computação quântica e estabelecê-la melhor- isso em meados da década de 90-, os estudiosos notaram que ela, por sua vez, era muito mais rápida e segura do que o tradicional modelo clássico para algumas tarefas importantes, como, por exemplo, problemas relacionados à busca de informação em um banco de dados que não esteja estruturado.

Outro exemplo prático que pode facilitar a compreensão diz respeito às senhas de e-mails e cartões de crédito. “A criptografia é responsável por proteger nossos dados on-line, tanto na transmissão como armazenamento. O principal protocolo utilizado para criptografar a informação, hoje, se utiliza de uma codificação baseada em números primos. Até agora, ninguém mostrou algum algoritmo clássico capaz de quebrar essa criptografia de maneira eficiente”, explica o docente.

Em 1994, o matemático do M.I.T*., Peter Shor, demonstrou que, se um dia conseguíssemos construir um computador quântico, ele seria capaz de implementar um algoritmo que poderia quebrar, facilmente, a criptografia atual de maneira eficiente. Na prática, isso significa que, caso a criptografia se mantenha da forma como está, um computador quântico poderá, muito facilmente, desvendar os algoritmos já existentes, baseados neste código. No entanto, se a tecnologia quântica for dominante, por consequência, a criptografia quântica é que tomará conta, tornando os códigos muito mais seguros.

O_caixeiro_viajanteNo início do século XX, pesquisadores perceberam, então, que outra forma de se trabalhar a computação seria possível. É quando entra em cena a computação quântica adiabática. Enquanto o modelo de circuito se utiliza de portas lógicas para realizar suas tarefas, a adiabática força uma evolução contínua do sistema. Numa definição mais simples, a computação quântica adiabática faz com que o sistema trabalhe no menor nível de energia possível. “Trata-se de um paradigma diferente para a realização da computação. Deixamos de proceder a computação através de uma sucessão de várias operações para uma situação na qual obtemos a resposta do nosso problema ao manipular o sistema físico sem permitir que ocorram transições entre seus estados quânticos”, explica Frederico.

A computação adiabática é capaz de transformar uma problemática abstrata (como a do exemplo do caixeiro viajante) e mapeá-la, de modo a transformá-la num problema físico, no qual a resposta será dada pelo sistema, através de seu estado fundamental. Daí surge um problema: como mapear problemas abstratos em sistemas físicos?

A computação adiabática também tenta resolver isso, transformando no “alfabeto quântico” problemas abstratos (como o do caixeiro) e resolvendo-os com a competência, exatidão e rapidez que, por enquanto, apenas um computador é capaz.

Prós e contras da novidade

De acordo com Frederico, a maior parte da comunidade científica continua trabalhando com computação quântica, utilizando somente o modelo de circuito. A base de dados e descobertas são muito maiores, e já há elementos que indicam que será possível implementar computação quântica através do modelo já existente. No entanto, uma parcela crescente considera a computação adiabática tão interessante (e promissora) quanto a quântica usual.

A chave para o sucesso da computação adiabática é conseguir-se manter o sistema no seu estado fundamental durante a implementação do algoritmo e, para que isso seja possível, os desafios são grandes. Primeiramente, é preciso evitar transições entre os níveis de energia quânticos. “Todo sistema físico, na natureza, interage com seu ambiente. Portanto, não há controle sobre essa interação e ela pode gerar erros e induzir a transições no sistema”, exemplifica Frederico. “Mas, assumindo-se que o sistema seja isolado, o que vai determinar a rapidez com que virá a resposta será a distância entre os níveis de energia do sistema, chamada de ‘gap’: quanto maior o gap, menor a chance de se cometer um erro na computação”.

Outro problema é que, quanto maior o tamanho do sistema, menor o gap, o que é muito ruim, pois quanto maior a quantidade de dados inserida no sistema, menor será seu gap e, portanto, o tempo de resposta e eficiência. “Com isso, o tempo de resposta demora muito! Essa é a principal crítica à implantação da computação adiabática”.

Ainda vale a pena?

Diante das duas desvantagens já citadas (dificuldade de mapeamento do problema físico e gap inversamente proporcional à quantidade de dados), por que a computação adiabática continua sendo atraente?

A grande vantagem da computação adiabática é que ela não exige a preservação da identidade quântica do sistema entre estados macroscopicamente distinguíveis. Traduzindo, o mundo macroscópico tende a interagir muito mais com o ambiente e a única “obrigação” da computação adiabática, nesse momento, é manter seu sistema no estado fundamental, para trazer as respostas dos problemas mapeados com eficiência e rapidez. “Mesmo assim, a computação quântica usual tem melhores condições de ser implementada”, ressalva o docente.

Frederico-adiabtica-1A computação adiabática ainda está na “infância”, tornando-se, portanto, um desafio aos estudiosos. Não há provas de que ela possa ser utilizada em todo e qualquer sistema físico. Há evidências, inclusive, de que, conforme aumentar-se a quantidade de dados, o gap tenderá a cair rapidamente. Mas, pode ser que em outros sistemas o gap não diminua tão rapidamente, tornando a computação adiabática mais eficaz em casos específicos.

Dentro das possibilidades abertas, a computação adiabática, além de um desafio aos pesquisadores, pode abrir novas portas, como aconteceu, por exemplo, com os dispositivos supercondutores mais bem explorados durante os estudos da computação quântica. “Rapidamente, verificou-se que esses dispositivos podem constituir um rico laboratório de testes de hipóteses quânticas”, relembra Frederico.

E como em toda pesquisa básica, somente o tempo e esforço de cada pesquisador é que terão a capacidade de abrir novas portas. Enquanto isso, conta-se com disposição, esforço e surpresas que podem ser evidenciadas no meio do caminho. E, talvez nesse meio, uma quarta tecnologia possa aparecer. É esperar para ver.

*Massachusetts Institute of Technology

Assessoria de Comunicação

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Instituto de Física de São Carlos - IFSC Universidade de São Paulo - USP
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