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8 de novembro de 2019

Os 60 anos de Glaucius Oliva e os 30 da Cristalografia de Proteínas

Glaucius Oliva, entre sua esposa, Claudia Tofaneli, e a Profª Yvonne Mascarenhas

Todo progresso humano está diretamente relacionado ao avanço do conhecimento promovido pela ciência. No século XXI, informação e conhecimento são os dois principais componentes da riqueza das nações. Todos os grandes desafios da humanidade, em saúde, suprimento de alimentos, energia, meio ambiente, sustentabilidade, superação de desigualdades, emprego, etc., só serão respondidos pela Ciência e Educação” – citação de Glaucius Oliva em sua apresentação (31/10/2019).

Falar de Glaucius Oliva e das comemorações do seu 60º aniversário, leva-nos inevitavelmente à enorme contribuição que este docente e pesquisador do IFSC/USP deu – e continua a dar – à ciência brasileira e mundial. Daí que, em simultâneo com as comemorações de seu aniversário, o IFSC/USP tenha comemorado também os 30 anos da Cristalografia de Proteínas no IFSC/USP, através de um magnífico workshop realizado no dia 31 de outubro, no Auditório “Prof. Sérgio Mascarenhas”.

Antes mesmo de ter início o evento, o Prof. Glaucius Oliva teve a oportunidade de comentar estas comemorações aos microfones da Rádio Universitária, com o jornalista Adão Geraldo, que abaixo reproduzimos.

Prof. Vanderlei Bagnato entrega o diploma ao homenageado

“Estas comemorações são, para mim, uma honra e uma generosidade dos nossos colegas, amigos do IFSC/USP e de todo o país, porque, ao longo dos anos, minha atividade não se restringiu apenas ao nosso Instituto, já que acabei tendo muitas atividades externas, inclusive no CNPq e na SBBq, que presidi por vários anos, e na reitoria da USP. É muito legal olhar para trás e perceber que um esforço grande que se fez – e faz – com muito amor, trabalho e dedicação, resultou na criação de uma área de pesquisa que hoje está amplamente distribuída pelo país. Em 1988/1989, quando regressei de meu doutorado na Inglaterra, este foi o meu primeiro e único laboratório de cristalografia de proteínas utilizando técnicas físicas para estudar a estrutura intima da matéria biológica. Hoje, temos cerca de trinta laboratórios espalhados pelo país inteiro, incluindo um grupo fortíssimo sediado no SINCROTRON, todos eles com alunos que saíram daqui, do IFSC/USP, e vemos uma área que se tornou pujante ao longo dos anos”, salientou o cientista.

Em relação ao futuro, Glaucius Oliva chamou a atenção para o fato de a biologia e medicina estarem passando por transformações marcantes proporcionadas pelo desenvolvimento de novas metodologias experimentais e de novas técnicas computacionais, que cada vez mais permitem ir mais além do que entender as proteínas isoladamente. “Toda essa área de cristalografia de proteínas, a gente procurava isolar uma proteína – humana, ou mesmo de um parasita que causa uma determinada doença, estudar a estrutura dessa proteína, para seguidamente desenvolver moléculas que pudessem se ligar a ela para o desenvolvimento de potenciais fármacos. Hoje, as metodologias nos permitem olhar para muitas proteínas simultaneamente, juntas atuando dentro das células. Esse é o grande desafio para o futuro, quando a biologia começar a não mais ser segmentada, mas sendo olhada como um todo. E a computação, usando técnicas de inteligência artificial, que permitem cada vez mais usar dados experimentais para prever e prevenir o aparecimento de doenças sérias, como câncer, doenças auto-imunes, doenças genético-moleculares, etc..”, pontuou Glaucius.

Prof. Richard Charles Garratt (IFSC/USP)  foi o mestre de cerimônias

Para o homenageado, todo progresso humano ao longo de nossa história, como espécie, foi resultado da atividade científica. Para Glaucius, é pela ciência, pelo conhecimento, que se poderá superar todos os grandes desafios da humanidade no futuro, como saúde, alimentação, meio-ambiente, transporte, etc.. “Aqui, no Brasil, vemos um movimento oposto, com corte de bolsas, fechamento de agências, o descaso para com a ciência, demissão de cientistas lideres de instituições de ponta porque simplesmente divulgaram fatos e dados experimentais e tudo isso não afeta só a nós, que temos grupos de pesquisa estabelecidos, mas afetará principalmente os jovens: o brilho nos olhos desses jovens está se apagando, eles estão desistindo de carreiras científicas porque não veem futuro. O país não valoriza a ciência, nem os cientistas. Estamos comprometendo o futuro do nosso país”, concluiu Glaucius Oliva.

Embora não tenha reunido todo o vasto contingente de cientistas nacionais e internacionais – algo que seria impossível, pelo número de colaboradores – que até o presente momento trabalharam e colaboraram com Glaucius Oliva em suas inúmeras pesquisas, o certo é que seus mais próximos parceiros, colaboradores, ex-alunos e amigos marcaram presença e testemunharam, através de apresentações, os avanços na ciência protagonizados pelo homenageado.

Sir Tom Blundell

A primeira ação destas comemorações foi protagonizada pelo diretor do IFSC/USP, Prof. Vanderlei Bagnato, que ofereceu ao Prof. Glaucius Oliva, em nome do Instituto, um diploma comemorativo dos “30 anos de Cristalografia de Proteínas do IFSC/USP”.

Como uma espécie de linha do tempo iniciada no início da década de 1980, o evento recordou quando Oliva estudou métodos de determinação de estruturas por difração de raios x em monocristais com aplicação em alguns complexos de lantadanídeos e metais de transição, bem como os estudos relativos a cristalografia de proteínas por meio de difração de raios-X (1984-1988), que lhe rendeu o título de doutor nessa área pela Universidade de Londres (Birkbeck College), sob a orientação do renomado cientista, Sir Tom Blundell*, que fez questão de estar presente no evento do dia 31.

Como já dissemos, por este workshop desfilaram os mais próximos colaboradores de Glaucius Oliva, a saber:

Prof. Glaucius Oliva apresentando seu seminário

Profª. Yvonne Primerano Mascarenhas (IFSC/USP); Sir. Tom Blundell (University of Cambridge); Prof. Aníbal Eugênio Vercesi (FCM/UNICAMP); Prof. Jerson Lima da Silva (IBqM/UFRJ); Profª. Helena Bonciani Nader (vídeo) (UNIFESP); Prof. Paulo Cezar Vieira (FCFRP/USP); Profª. Arlene Gonçalves Corrêa (DQ/UFSCar); Profª. Vanderlan da Silva Bolzani (UNESP-Araraquara); Prof. Marcos Roberto de Mattos Fontes (UNESP-Botucatu); Profª. Dulce Helena Ferreira de Souza (UFSCar); Profª. Maria Cristina Nonato (FCFRP/USP); Drª. Beatriz Gomes Guimarães (Instituto Carlos Chagas/FIOCRUZ – Curitiba) ; Profª. Leila Maria Beltramini / Profª. Ana Paula Ulian de Araújo (IFSC/USP); Prof. Rafael Victório Carvalho Guido (IFSC/USP); Prof. Adriano Defini Andricopulo (IFSC/USP); Prof. Otavio Henrique Thiemann (IFSC/USP); Dr. Andre Schutzer de Godoy (Pós-Doc IFSC/USP).

A apresentação do Prof. Glaucius Oliva – que marcou o encerramento do evento e que congregou suas principais etapas no trabalho desenvolvido ao longo dos anos na área da Cristalografia de Proteínas – Protein Christallography in Brazil: A personal recollection -, iniciou-se pela citação reproduzida no início desta matéria, ao que se seguiu uma breve abordagem a uma das passagens do livro intitulado The social function of Science (Nova York – The Macmillan Company – 1939), da autoria de John Desmond Bernal** (Birkbeck College – University of London – 1939), que abaixo reproduzimos em tradução livre.

“Existem dois pontos de vista nitidamente distintos, que podem ser chamados de imagens ideais e realistas da ciência. No primeiro, parece haver uma preocupação apenas com a descoberta e contemplação da verdade; sua função, distinta da cosmologia mística, é construir uma imagem de mundo que se encaixe nos fatos relativos à experiência. Se é também de utilidade prática, tanto melhor, desde que seu verdadeiro objetivo não seja a perda. No segundo ponto de vista, a utilidade predomina; a verdade aparece como um meio de ação útil e só pode ser testada por essa ação.

Glaucius Oliva no meio de seus colaboradores

A história da ciência mostra que seu crescimento é contínuo, em geral, e que as direções gerais do desenvolvimento econômico e o grau e a escala em que a ciência progride são aproximadamente proporcionais à atividade comercial e industrial. Os principais países industriais do mundo também são os principais países científicos. Até recentemente, a ciência na América Latina sofria com as mesmas deficiências que afligiam as grandes nações. Na época  colonial, particularmente no seu início, algo foi feito nas áreas da história natural e mineração, mas o interesse logo desapareceu e as revoluções e guerras civis que se seguiram durante a maior parte do século XIX não foram propícias ao desenvolvimento da ciência. No século atual (XX), porém, sob a influência dos EUA e do pensamento liberal ressurgente, está começando um renascimento da ciência, do qual muito se pode esperar, particularmente no México e na Argentina, onde desenvolvimentos notáveis foram feitos na medicina, biologia e arqueologia”.

Tendo destacado o importantíssimo trabalho desenvolvido atualmente pelo CIBFar – Centro de Pesquisa e Inovação em Biodiversidade e Fármacos (CEPID-FAPESP) -, sediado no IFSC/USP, que congrega o Laboratório de Química Medicinal e Computacional (LQMC) e Laboratório de Biofísica Molecular (IFSC/USP), o Núcleo de Bioensaios, Biossíntese e Ecofisiologia de Produtos Naturais (NUBBE/IQ/UNESP), Laboratórios de Síntese Orgânica (IQ/UNICAMP), Laboratórios de Produtos Naturais e Síntese Orgânica (DQ/UFSCar) e Laboratório de Produtos Naturais (FCFRP/)USP) -, o Prof. Glaucius Oliva terminou sua apresentação com um agradecimento a todos quantos participaram na dupla comemoração, em especial sua família, que considerou como sendo a base fundamental para seus equilíbrios pessoal e profissional.

 

Glaucius Oliva e sua família

Impossibilitado de estar presente no evento, o Prof. Sérgio Mascarenhas enviou, por áudio, um soneto comemorativo do 60º aniversário de Glaucius Oliva:

 SONETO PARA GLAUCIUS AOS 60!

Ele agora aos 60 completa

Uma vida de muito sucesso

de vitórias já muitas: repleta!

de legados que trazem progresso.

 

Pra Reitor da USP indicado ,

Ganhou o primeiro lugar!

Mas manobras de baixo calado

Não deixaram o Glaucius ganhar.

 

Foi até  melhor porque

do mais amplo CNPq

Pode exercer  Presidência

 

Assim elevando a Ciência!

Pois pra isso ele  tem dom!

Como Sucessor brilhante da Yvonne e do Tom!

 

Clique AQUI para acessar uma seleção de imagens do evento.

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*Sir Thomas Leon Blundell (07/07/1942) é um bioquímico britânico e biólogo estrutural. Foi membro da equipe de Dorothy Hodgkin, que resolveu em 1969 a primeira estrutura de um hormônio protéico – a insulina. Blundell fez contribuições para a biologia estrutural dos hormônios polipeptídicos, fatores de crescimento, ativação de receptores, transdução de sinal e reparo de quebra de fita dupla de DNA, temas extremamente importantes para as áreas de câncer e tuberculos. Ele desenvolveu um software para modelagem de proteínas e compreensão dos efeitos de mutações na função das proteínas, levando a novas abordagens para a descoberta de chumbo guiada por estrutura e baseada em fragmentos. Em 1999, Blundell co-fundou a empresa oncológica Astex Therapeutics, e desempenhou um papel central na reestruturação dos conselhos de pesquisa britânicos e, como presidente do Conselho de Ciência do Reino Unido, no desenvolvimento do profissionalismo na prática da ciência.

**John Desmond Bernal (10 de maio de 1901 / 15 de setembro de 1971) foi um pesquisador irlandês pioneiro no uso da cristalografia de raios X na biologia molecular, tendo escrito vários livros populares sobre ciência e sociedade. Após a formatura, Bernal começou a pesquisar, com William Henry Bragg, no Davy Faraday Laboratory, na Royal Institution em Londres. Em 1924, o cientista determinou a estrutura da grafite (o empilhamento Bernal descreve o registro de dois planos de grafite) tendo igualmente trabalhado na estrutura cristalina do bronze. Em 1927, foi apontado como o primeiro professor de cristalografia estrutural em Cambridge, tendo-se tornado diretor assistente do Laboratório Cavendish, em 1934. Aqui ele começou a aplicar suas técnicas cristalográficas em moléculas orgânicas, começando com compostos de estrina e esterol, incluindo o colesterol, em 1929, forçando a uma mudança radical de pensamento entre os químicos. Enquanto estudava em Cambridge, analisou a vitamina B1 (1933), a pepsina (1934), a vitamina D2 (1935), os esteróis (1936) e o vírus do mosaico do tabaco (1937). Também trabalhou na estrutura da água líquida, tendo mostrado mostrando a forma bumerangue de sua molécula (1933). Foi no grupo de pesquisa de Bernal onde, após um ano trabalhando com Tiny Powell, em Oxford, que Dorothy Hodgkin continuou sua carreira de pesquisa. Juntos, em 1934, eles tiraram as primeiras fotografias de raios-X de cristais de proteínas hidratadas, usando o banho de cristais em seu licor mãe, dando um dos primeiros vislumbres do mundo da estrutura molecular subjacente aos seres vivos. Em 1937, Bernal tornou-se professor de física no Birkbeck College, Universidade de Londres, tendo sido eleito, no mesmo ano, membro da Royal Society.Após a Segunda Guerra Mundial, ele estabeleceu o Laboratório de Pesquisa Biomolecular do Birkbeck College em duas casas em Torrington Square, no bairro de Bloomsbury (Londres), com 15 pesquisadores. Aaron Klug trabalhou na ribonuclease, enquanto Andrew Booth desenvolveu alguns dos primeiros computadores para ajudar no cálculo. Rosalind Franklin ingressou no King’s College e fez um trabalho pioneiro em vírus até sua morte prematura em 1958. Em The Social Function of Science (1939), ele argumentou que a ciência não era uma busca individual de conhecimento abstrato e que o apoio à pesquisa e desenvolvimento deveria ser drasticamente aumentado.

Rui Sintra – Assessoria de Comunicação – IFSC/USP

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