De algum tempo para cá, estamos vendo entrar em extinção aparelhos eletrônicos e eletrodomésticos que têm seu funcionamento com 220 volts. Mas, afinal, o que é mais vantajoso ao consumidor: aqueles que funcionam com 110 ou 220?
Para responder a essa pergunta, primeiramente é interessante entender melhor como funciona o circuito elétrico dentro dos aparelhos que comumente utilizamos em nosso dia a dia. Quando plugamos um aparelho eletrônico ou eletrodoméstico na tomada, há dois polos principais : em um deles entram elétrons e do outro saem elétrons. Durante essa travessia, o aparelho, ao servir de “intermediário”, é colocado em funcionamento. Ou seja, é essa travessia de elétrons de um polo para outro que ocorre dentro dos aparelhos é que aciona seus motores, aquece suas espirais etc.
Com essa simples definição em mente, podemos avançar para nossa pergunta inicial: o que é melhor, então, aparelhos que funcionam com 110 ou 220 volts? A resposta é: depende.
Tudo é relativo (e fiação)
Tecnicamente, não há diferença nenhuma. Seja em 110 ou em 220, o desempenho dos aparelhos e o mesmo e os fabricantes escolhem a voltagem de acordo com a disponibilidade de cada local. Em países europeus, por exemplo, a maioria das tomadas é de 220V, enquanto no Brasil e Estados Unidos predominam 110V.
Porém, não referente ao desempenho, mas à economia de energia, poderá haver desvantagens dependendo do aparelho escolhido. Como muitos sabem, os “vilões” das contas de luz são chuveiros, secadoras de roupas, secadores de cabelos, aquecedores etc. O que eles têm em comum? Precisam produzir calor e, por esse motivo, gastam muito mais energia. Nestes casos específicos, o 220V pode ser mais vantajoso. “Considerando-se alguns padrões de funcionamento, uma geladeira funcionando no 220V economiza menos de 10% de energia se comparada a uma de 110V. Mas já uma secadora de roupas ligada no 220V gasta, em média, 30% a menos, uma economia expressiva”, explica o docente do Grupo de Física Teórica do Instituto de Física de São Carlos (IFSC/USP), Luiz Nunes de Oliveira.
Para entender melhor essa economia de energia, imagine uma queda d´água, supondo que 110V represente uma queda d´água de um metro e 220V de dois metros. Quanto maior a queda, mais fácil se retirar energia. Comparando-se com exemplos reais, 220V exige a passagem de menos elétrons e, portanto, menor gasto energético nos fios que conduzem eletricidade até a tomada. “É a passagem de corrente elétrica que aumenta o gasto de energia, uma energia gasta à toa, diga-se de passagem, pois quanto mais corrente passa no fio, mais calor é gerado, que, inclusive, cresce com o quadrado da corrente”, exemplifica o docente.
Ou seja, se você dobrar a corrente, aumenta-se quatro vezes o calor que passa pelo fio, uma consequência indesejada e que pode causar até mesmo incêndios, em casos extremos.
Mas, na realidade, o que realmente influencia o maior ou menor gasto dos aparelhos elétricos é o fio por onde a energia passa. Se a fiação de uma casa for dimensionada de acordo com os padrões atuais, aparelhos de 110 e 220V trarão o mesmo gasto. E, para melhor entender essa premissa, façamos uma analogia: imagine um cano de PVC por onde passa água. Mas imagine que, em vez de água, passe mel por esse cano. Num cano mais grosso, o mel passará sem maiores dificuldades, enquanto num cano com diâmetro menor, a dificuldade será maior. “Se você construir uma casa e a fiação estiver de acordo com as normas, o gasto de energia no fio será insignificante. Mas há muitas casas que não possuem a fiação adequada e, por isso, a chance de maior gasto, bem como de curtos circuitos é grande”, elucida Luiz Nunes. “O mesmo vale para emenda de fios: se elas forem mal feitas, o gasto de energia quando a eletricidade passa por eles será maior. No caso de 220V, esse gasto será, realmente, quatro vezes maior”.
Alguns poréns
Qualquer aparelho elétrico consome energia de duas maneiras. Parte do gasto ocorre no próprio aparelho e esse consumo é o mesmo com 110V ou 220V. Um chuveiro, por exemplo, gasta eletricidade para esquentar a água. Seja com 110V, seja com 220V, a resistência no seu interior precisará da mesma energia para elevar a temperatura de, por exemplo, 15ºC a 40ºC, seja com 110 V ou 220V. Mas, para a eletricidade chegar até o aparelho, ela precisa correr pelos fios escondidos dentro das paredes, e os fios também gastam eletricidade.
O consumo nos fios depende da voltagem do aparelho. Se o aparelho funcionar a 110V, os fios gastarão quatro vezes mais energia do que se ele trabalhar a 220V. “Digamos que os fios gastem 10% da energia consumida por um chuveiro de 220V, os mesmos fios gastarão 40% da energia consumida por um chuveiro de 110V. Da mesma forma, se a fiação gastar 0,5% da energia consumida por um chuveiro de 220V, a mesma fiação gastará 2% da energia de um chuveiro de 110V. No primeiro caso, boa parte da conta de luz se deverá aos fios que alimentam o chuveiro, e será muito vantajoso trabalhar com 220V. No segundo, quase não haverá diferença entre 110V e 220V”, exemplifica o docente.
A questão, portanto, é quanta energia os fios gastam. Numa casa construída com os padrões modernos, a fiação é grossa o suficiente para tornar insignificante o consumo ao longo dos fios. Entretanto, muitas das casas construídas no século XX não seguiram esse padrão, e mesmo hoje muitas são construídas com instalações elétricas abaixo do padrão, pois o cobre dos fios custa muito caro. Outro problema são as conexões (emendas entre fios) mal feitas, que também consomem energia. Nesses casos, uma fração importante da conta de luz será gasta para aquecer os fios ou as conexões, sem nenhum resultado desejável. Aparelhos com 220V reduzirão esse gasto inútil em relação a aparelhos com 110V.
Por que, então, 110V tem predominado em alguns países, como o nosso?
Simplesmente por uma questão de segurança. Levar um choque de uma tomada de 220V é duplamente mais perigoso. De acordo com Luiz Nunes, ao colocar as mãos numa tomada, nós fazemos o papel dos aparelhos: servimos de intermediário para entrada e saída de elétrons. Mas, diferente dos aparelhos, não temos nenhum motor interno que aglomere toda essa energia e a devolva ao outro polo da tomada.
Visualize algo maior: a energia produzida na Hidrelétrica de Itaipu (PR). Até chegar a nossas casas, há um trajeto pelo qual ela passa no qual diversas alterações de voltagem são produzidas, tudo isso nos transformadores localizados nas linhas de transmissão. Até aí, são altíssimas voltagens, já que há muitas perdas energéticas pelo caminho. Somente nas subestações de distribuição é que essa voltagem é reduzida para, posteriormente, caminhar pela fiação dos postes e, finalmente, chegar aos interruptores domésticos (entenda melhor o processo clicando aqui).
Mesmo que as tomadas representem perigo, o maior número de acidentes, principalmente com crianças, ainda é nos fios de alta tensão. Quem já soltou pipa sabe bem do que estamos falando. Segundo dados divulgados pela Associação Brasileira de Conscientização para os Perigos da Eletricidade, em 2013 foram registrados dois óbitos diários causados por acidentes com eletricidade, além de 173 incidentes que não chegaram a matar, mas deixaram sequelas.
Assim fica mais fácil se conformar com uma conta de energia mais “rechonchuda”. Reduzir o perigo que está em nosso alcance diariamente é a melhor pedida, mesmo que financeiramente, em alguns casos, isso não pareça nem um pouco vantajoso.
Assessoria de Comunicação