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24 de junho de 2013

Molecules, Materials and Medicines for Neglected Diseases

M3MD

Uma iniciativa mundial, nascida através de uma parceria internacional composta por um grupo lato de renomados pesquisadores da academia, indústria e representantes governamentais iniciou, há cerca de um ano e meio, um trabalho que tem o objetivo de criar uma nova metodologia que melhore a eficácia dos medicamentos dedicados às designadas doenças negligenciadas. Através da química do estado sólido, o objetivo é desenvolver novas formulações orais e combinações que aumentem a eficácia de medicamentos orais já existentes e que combatem essas doenças, com o intuito de anular seus efeitos colaterais, promovendo, principalmente, o aumento da solubilidade desses remédios.

O grupo, designado de M3ND – Molecules, Materials and Medicines for Neglected Diseases, conta com o trabalho de treze pesquisadores e de responsáveis laboratoriais oriundos de várias partes do mundo, como, Índia, África do Sul, Argentina, Irlanda, Estados Unidos, México, Canadá e Brasil: a participação de nosso país, neste grupo, está sendo feita através dos pesquisadores Alejandro Ayala (UFC – Universidade Federal do Ceará), Chung Man Chin (UNESP – Araraquara) e Javier Ellena, do IFSC – Instituto de Física de São Carlos (USP).

As doenças negligenciadas continuam a ocupar um lugar contraditório num mundo onde a evolução científica e tecnológica desbrava caminhos nunca dantes imaginados, em que a esperança de vida aumenta exponencialmente. Todos os dias, novas descobertas científicas abrem portas para a eminente cura de inúmeras de doenças, menos para aquelas de chamadas doenças negligenciadas – ou doenças dos pobres -, que, pelo seu foco, são pouco interessantes para as indústrias farmacêuticas, já que praticamente não dão lucro.

Assim, a ação do M3ND traduz-se num trabalho de pesquisa internacional, visando uma aplicabilidade concreta para a indústria, traduzida num trabalho de engenharia de novas fórmulas sólidas de fármacos: embora seja um trabalho complexo, do ponto de vista laboratorial, a ideia primária é simples. Para combater qualquer doença, o primeiro passo é “desenhar” um fármaco que mostre eficácia no combate a esse alvo, ao que se segue outro passo importante, que é transformar esse “desenho” – que mais não é do que uma molécula – num fármaco, que, principalmente no caso das doenças negligenciadas (Malária, Doença de Chagas, etc.), é majoritariamente apresentado na forma de um sólido farmacêutico – um simples comprimido -, até porque, se fosse injetável, teria questões relacionadas com armazenamento, aplicabilidade e segurança, etc.

COQUETELContudo, um dos grandes problemas desse tipo de comprimidos – desses fármacos sólidos – é não se dissolverem no corpo dos pacientes: ao ingerirem esses comprimidos, os pacientes pensam que o medicamento interage com o organismo, mas isso não acontece. Ou seja, a doença não é debelada, não é curada. Um exemplo disso são os retrovirais utilizados para o controle da AIDS, como explica o Prof. Javier Ellena, pesquisador do IFSC e membro do M3ND. De fato, esses pacientes tomam, durante muito tempo, um coquetel que é composto por vinte produtos e todos eles apresentam grandes problemas quanto à sua solubilidade: graças a isso, é o doente quem sofre. Ao interagirem entre si e o organismo, esses medicamentos que compõem o referido coquetel apresentam uma eficácia reduzida, acrescida de inúmeros efeitos colaterais, que são terríveis. Por exemplo, com esse tipo de medicamento, um paciente com AIDS poderá estabilizar a doença, porém, também irá sofrer fortes efeitos colaterais, tais como problemas hepáticos, diarreia, vômitos, enfraquecimento do sistema imunológico, etc. O que nós estamos fazendo é trabalhar para minimizar ou anular as dificuldades de solubilidade desses medicamentos no organismo e neutralizar os efeitos colaterais nos pacientes. Estamos fazendo a aplicação da tecnologia do estado sólido às indústrias farmacêuticas, refere Ellena.

Assim, ao contrário do que se possa pensar, a ação do grupo de pesquisadores não é fazer um novo medicamento, até porque isso levaria mais de uma década, até ficar concluído. O objetivo do grupo M3ND é pegar nos medicamentos que já existem no mercado, que são destinados a doenças negligenciadas, e transformá-los em versões melhoradas, com propriedades farmacocinéticas reforçadas, tendo em vista o bem-estar dos pacientes e a resolução das situações.

Esta equipe é composta por diversos pesquisadores internacionais, não só ligados a universidades de renome mundial, que são especialistas em áreas tão diversas como, por exemplo, química, medicina, biologia, farmácia, física, etc., mas também por pesquisadores e outros profissionais ligados à indústria farmacêutica internacional e a órgãos vocacionados a patentes de produtos.

Como já foi referido, o grande intuito é trabalhar para melhorar medicamentos que estejam exclusivamente dedicados a doenças negligenciadas, ou mesmo para a AIDS, embora esta última não seja negligenciada – dependendo do ponto de vista. É que se observarmos a AIDS na perspectiva do continente africano, por exemplo, a doença já entra no catálogo de doença negligenciada, já que, devido à falta de políticas de saúde, pouca gente tem acesso aos medicamentos que combatem essa doença, devido ao alto custo de um tratamento que pode se prolongar por vários anos.

No Brasil, por exemplo, se a AIDS está de alguma forma controlada, é fato que isso se deve aos investimentos feitos pelos governos e às políticas implantadas na área da saúde pública, coisa que não acontece na maior parte dos países africanos. O trabalho e o projeto do grupo M3ND abrangem todas as frentes já citadas, com o foco de disponibilizar medicamentos mais eficazes, com maior qualidade, mais baratos e, por isso, mais acessíveis.

Patente em tramitação

O desenvolvimento do trabalho do grupo M3ND tem sido rápido e eficaz, sendo prova disso o trabalho já realizado para o melhoramento de um medicamento, cuja tramitação da patente já corre no Brasil: “Neste momento, temos um medicamento contra a AIDS, completamente desenvolvido por nós, cuja patente está sendo tramitada no INPA – Instituto Nacional de Patentes. É um medicamento que se apresenta cinco vezes mais eficaz do que aquele que está no mercado. O resultado é que você consegue produzir o mesmo comprimido com cinco vezes menos matéria-prima e com uma eficácia largamente superior, com melhor absorção pelo organismo, neutralizando efeitos colaterais e fazendo com que o paciente ingira menos quantidades de químicos fármacos. Já para não falar que essa é uma patente brasileira. Se começarmos a fazer este trabalho em muitos outros medicamentos que são utilizados em países em desenvolvimento, os resultados serão significativos em termos de custos, de gastos públicos e de saúde pública, refere Javier Ellena.

Outro exemplo dado por Javier Ellena é o Mebendazol, que é um medicamento bastante utilizado para o controle de parasitas no organismo humano e que é consumido principalmente em zonas pobres, onde os índices de higiene e de salubridade pública são baixos. JAVIER400Esse medicamento tem grandes problemas na sua versão de estado sólido, conforme explica o pesquisador: “Vou tentar explicar de uma forma muito básica, só para que o leitor entenda melhor. Para fazer esse comprimido são utilizadas doses certas de, por exemplo, dois pós: o branco e o amarelo. O pó branco é aquele que funciona bem para combater a doença, enquanto que o pó amarelo faz muito menos efeito. Então, se formos analisar esse comprimido, ele tem 90% de pó amarelo e 10% de pó branco, logo, o comprimido não faz efeito: para esta fórmula fazer qualquer efeito benigno, o paciente terá que se encharcar em comprimidos e arrebenta com o estômago e o com o fígado, só para dar dois exemplos de reações adversas. Mas porque é que isso acontece? Porque o pó branco custa R$ 100,00/grama e o pó amarelo custa R$0,10/grama. Noventa por cento dos medicamentos que são dedicados a doenças negligenciadas têm esse defeito – ou particularidade. Este nosso medicamento, que está esperando ser patenteado, foi feito com as quantidades certas de determinado ingrediente, mesmo que esse ingrediente tenha sido aquele que eu exemplifiquei como sendo o mais barato – o pó amarelo -, só que ele fica cinco vezes mais eficaz, explica Javier Ellena.

Este grupo internacional está trabalhando em diversas frentes, em diversos alvos, como, por exemplo, no combate à Doença de Chagas. O grupo começou sua atividade há cerca de um ano e dois meses e nele trabalham nomes importantes da ciência mundial, como, por exemplo, Gautam Desiraju, pesquisador do Indian Institute of Science – Índia, que tem uma vastíssima experiência no campo da engenharia de cristais, aplicada a farmácia, ou Marcelo Sarkis, pesquisador do Heenan Blaikie – LLP, do Canadá, que é um expert em questões relacionadas com patentes.

Contudo, este é um trabalho que precisa ser conhecido, principalmente pelas indústrias farmacêuticas nacionais e pelo próprio governo brasileiro, já que o que está em causa é a resolução de inúmeros problemas de solubilidade de qualquer medicamento, daí a utilidade deste projeto junto das empresas farmacêuticas. Uma das iniciativas do grupo é promover, ainda este ano, entre os meses de Novembro e Dezembro, um workshop com as indústrias farmacêuticas nacionais, explicando todo este trabalho e seus resultados, dando inclusive ênfase à questão de segurança nacional, já que as matérias-primas e a maioria dos medicamentos comercializados no Brasil vêm do exterior, com graves problemas na área do controle de qualidade.

Resumindo todo este projeto, o foco do grupo M3ND traduz-se nas seguintes medidas:

1 – Utilizar tecnologia do estado sólido aplicada a produtos farmacêuticos;

2 – Obter melhores preços;

3 – Fazer patentes incrementais que possam, em curto espaço de tempo (um ou dois anos), promover medicamentos completamente novos que, com base nos que já existem, se transformem em novos medicamentos que resolvam os graves problemas de saúde pública, quer em termos nacionais, quer internacionalmente, principalmente no capítulo das doenças negligenciadas.

O M3ND conta com os apoios do CNPq (Ciência sem Fronteiras), CAPES e FAPESP, bem como as colaborações do IFSC-USP, FUNCAP, Ministério da Saúde, USF – University of South Florida – USA, UFC – Universidade Federal do Ceará.

O lote de pesquisadores envolvidos neste vasto projeto é o seguinte: Javier Ellena (IFSC-USP – Brasil); Alejandro Ayala (UFC – Universidade Federal do Ceará – Brasil); Chung Man Chin (Unesp – Araraquara – Brasil); Gautam Desiraju (Indian Institute of Science – Índia); Gaurav Sahal (IPCA – Laboratories – Índia); Susan Bourne (University of Cape Town – África do Sul); Maria Eugenia Olivera (Universidad Nacional de Córdoba – Argentina); Jon O’Halloran (SSPC – University of Limerick – Irlanda); Michael Zawarotko, Dennis Kyle e Roman Manetsch (University of South Florida – Estados Unidos da América); Orn Almaersson (Alkermes – Estados Unidos da América); Drazen Ostovic (KO Pharm R&D – Estados Unidos da América); Hugo Morales-Rojas – UAEM – Universidad Autónoma del Estado de México – México) e Marcelo Sarkis (Heenan Blaikie – LLP – Canadá).

Para informações complementares sobre este projeto, clique AQUI

Assessoria de Comunicação

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Instituto de Física de São Carlos - IFSC Universidade de São Paulo - USP
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