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21 de outubro de 2011

Como uma nova descoberta “quântica” poderá revolucionar nossas vidas

diogoMoléculas, átomos, elétrons e prótons são conhecidos por uma grande maioria, mas sua definição por muitos poucos. No entanto, o conhecimento desses elementos da natureza por alguns estudiosos é muito bem definido e, mais do que isso, protagonistas em suas rotinas de estudo.

Nove físicos brasileiros, há mais de um ano, estudam o misterioso mundo da mecânica quântica, teoria física elaborada no início do século XX, onde os elementos citados acima, formalmente conhecidos por partículas subatômicas, são alguns dos alicerces que mantém a teoria a todo vapor.

Se, por um lado, os principais elementos que sustentam a mecânica quântica são bem conhecidos, inclusive pelo público leigo, entender sua definição torna-se muito mais difícil- e mais ainda aprofundar-se no assunto. “A mecânica quântica foi uma revolução do ponto de vista científico. Vivemos no ‘mundo clássico’, ou seja, cercado por objetos de grandeza macroscópica, mas quando olhamos para objetos cada vez menores, em algum ponto, a física que nós temos, deixa de valer”, explica Diogo Soares Pinto, pós-doutorando do Instituto de Física de São Carlos (IFSC/USP) e estudioso do assunto.

O tamanho dos elementos que compõe o mundo quântico pode variar desde quarks e núcleo dos átomos até spins eletrônicos e condensados de Bose-Einstein*, já considerados elementos macroscópicos. O que vale é o comportamento quântico, no qual os objetos que dele fazem parte são capazes das mais audaciosas estripulias, como atravessar barreiras.

Alguns anos depois de inaugurada a mecânica quântica, três físicos, entre eles Albert Einstein, passaram a questionar se a teoria seria, de fato, completa, no seguinte aspecto: no mundo quântico, as coisas existem somente se podemos medi-las ou elas existem e interagem, mesmo que, fisicamente, muito distantes umas das outras? E, depois de tais questionamentos, o assunto passou a ganhar mais atenção no mundo acadêmico.

A principal revolução da mecânica quântica diz respeito, especialmente, ao transporte de informação. Isso porque seus elementos interagem à distância- que pode chegar a milhares de quilômetros. Tal fenômeno interativo foi chamado “emaranhamento”.

Ou seja, no mundo quântico, as propriedades dos elementos que os compõe estão, diretamente, ligadas umas às outras. “O que um elemento faz afeta o outro, automaticamente. Não há sentido olhá-los separadamente”, explica Diogo.

E, enquanto no mundo clássico, as propriedades dos elementos são exatas e determinadas, isso não acontece no quântico. Nele se trabalha com probabilidades, mesmo que muito pequenas.

Um novo fenômeno

Imagine a seguinte cena: você está em dentro de um bar e um amigo ao lado de fora. O bar está lotado e, mesmo assim, você consegue conversar com ele, como se o fizesse por telepatia. No mundo quântico, isso é possível, mas, no caso, não são amigos, mas partículas que mantém essa “conversa”, via essa correlação quântica, independente da distância em que se encontrem, perdendo suas características individuais. É como se fossem uma única entidade, em dois corpos diferentes.

Pensando nisso tudo, passou-se a pensar na computação quântica. Os planos para construção de computadores quânticos poderão processar as informações tão rapidamente que o modo como temos hoje pode virar coisa da idade da pedra. “Quando escrevemos um e-mail, por exemplo, os computadores criptografam a informação baseando-se em algoritmos matemáticos. No mundo quântico, isso será infinitamente mais rápido e seguro”, explica Diogo.

Além de uma velocidade mais rápida, o quântico pode trazer mais segurança ao mundo virtual, visto que é muito mais difícil de ser decodificado. Para que o acesso a contas bancárias não seja desvendado por hackers, por exemplo, é preciso que os desenvolvedores de softwares criptografem as informações, como senha do usuário. “Os códigos de criptografia clássicos são, em princípio, quebráveis. Do ponto de vista quântico, isso seria impossível, em virtude do emaranhamento”, conta o pesquisador.

A partir da década de 80, tais fatos passaram a ter grande repercussão, principalmente em um artigo publicado na Physical Review Letters**, onde o teletransporte tornou-se um fato. Matematicamente, foi provado que as informações poderiam ser teletransportadas, de um local a outro.

Posteriormente, graças aos estudos de outros pesquisadores, chegou-se a uma nova conclusão: se o emaranhamento refere-se exclusivamente a um fenômeno do mundo quântico, nem todo sistema do mundo quântico depende do emaranhamento. Em temperatura ambiente e condições normais, alguns sistemas não apresentam emaranhamento e um exemplo disso é a Ressonância Magnética Nuclear (RMN). “Imaginava-se que o emaranhamento era extremamente necessário para alcançar-se ganho de velocidade, na hora de ler uma informação. Com isso, uma nova questão foi feita: o que a RMN tem para trazer essa possibilidade do uso da técnica para o processamento de informação quântica?”.

A grande descoberta nascida em território nacional

Depois de observar que, através da técnica de RMN, as propriedades quânticas entravam em ação, apesar da ausência do emaranhamento, ficou uma interrogação de como isso seria possível. Foi quando os cientistas brasileiros, citados no início dessa matéria, trouxeram a resposta. “Voltando à analogia da conversa de dois amigos, postados fora e dentro de um bar, a explicação para esse fato seria dizer que eles, também, estão correlacionados, mas, nesse caso, mantendo as características individuais. Em outro artigo científico, publicado em 2001, por Harold Ollivier and Wojciech H. Zurek, foi provado que existia uma co-dependência entre partículas que não se tratava do emaranhamento, o que os pesquisadores chamaram de ‘discórdia quântica'”, explica Diogo.

Resumidamente, a diferença entre a medida de correlação (dependência) entre duas partículas no mundo clássico e duas do mundo quântico é, justamente, o que define o novo fenômeno da discórdia.

Diogo, em conjunto com Tito José Bonagmba e Eduardo Ribeiro de Azevêdo, também pesquisadores do IFSC, e outros seis estudiosos da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF) e Universidade Federal do ABC (UFABC) fizeram a seguinte experiência: criaram um estado de discórdia quântica entre átomos de hidrogênio e carbono, tirados do clorofórmio (CHCl3) e mediram-na, utilizando-se de RMN (em temperatura ambiente), para tentar descobrir o que acontece quando um elemento passa de um estado clássico para o quântico. “Analisamos a deterioração da correlação entre as partículas através dessa experiência, e mostramos que, não só existe discórdia quântica em RMN, mas também podemos medi-la”.

Essa experiência quântica, por outro lado, pode ser interrompida por certos “ruídos” (qualquer forma de agitação molecular, causada, por exemplo, pelo aumento da temperatura) que enfraquecem a correlação entre as partículas. “Mesmo com a interferência de certos ruídos, a discórdia quântica é mais robusta que o emaranhamento”, explica Diogo.

Ou seja, a descoberta dos cientistas conseguiu encontrar uma relação quântica mais potente e menos exigente, utilizando-se de uma técnica, relativamente, simples, e muito bem estabelecida no mundo científico. As discussões tiveram início em 2009, a conclusão da experiência um ano depois para, finalmente, eles chegarem a resultados concretos e terem sido reconhecidos por cientistas do mundo inteiro, isso sem contar a publicação de dois artigos científicos, no mesmo volume da PRL** (ver artigos aqui e aqui). “Conseguimos dar uma boa contribuição nos estudos dessa área”, comemora o pós-doutorando.

Quando seremos afetados?

Se os computadores pessoais substituíram as antigas máquinas de datilografia, num futuro muito próximo, os computadores quânticos, certamente, estes aposentarão nossos atuais PCs.

Depois da descoberta do fenômeno da discórdia quântica, estudiosos esperam que a velocidade do processamento dos computadores quânticos seja maior. “Por se tratar de uma correlação mais robusta do que o emaranhamento, a discórdia também favorecerá a velocidade”, afirma Diogo.

Nos próximos passos desse projeto, juntamente aos outros pesquisadores envolvidos, novos testes serão realizados para comprovar a eficiência no processamento de informações (resolução de cálculos), tendo como base RMN e discórdia quântica. “Inevitavelmente, as propriedades quânticas serão necessárias, pois assim estará sendo usado todo o potencial quântico ao nosso alcance. Toda comunicação que conhecemos será afetada por isso, em breve”, diz.

A empresa canadense, “D-wave”, em 2011, afirma ter vendido seu primeiro computador quântico pelo valor de Us$ 10 milhões. O sistema de TV a cabo Tóquio já é, inteiramente, baseado em criptografia quântica. E outras empresas, do mundo todo, já investem pesado na nova tecnologia. “O código quântico é capaz de quebrar qualquer outro clássico, mas a recíproca não é verdadeira”, conta Diogo.

Mas, seja por emaranhamento ou discórdia, algo com que todos os estudiosos do assunto “concordam” é que, pensar na mecânica quântica, no passado, era visualizá-la de maneira inatingível. Mas, hoje, depois de tantos estudos, ela nunca foi tão palpável e, ao mesmo, tão próxima da realidade de todos nós- embora ainda pareça uma coisa de outro planeta.

 

* fase da matéria formada por bósons, a uma temperatura muito próxima do zero absoluto. Nestas condições, uma grande fracção de átomos atinge o mais baixo estado quântico e, nestas condições, os efeitos quânticos podem ser observados à escala macroscópica. A existência deste estado da matéria, como consequência da mecânica quântica, foi inicialmente prevista por Albert Einstein, em 1925.O primeiro condensado deste tipo foi produzido setenta anos mais tarde, por Eric Cornell e Carl Wieman, em 1995, na Universidade de Colorado em Boulder, usando um gás de átomos de rubídio arrefecido a 170 nanokelvins (nK).

**uma das revistas científicas mais notórias em publicações de estudos e matérias jornalísticas sobre física, criada em 1958.

Fonte: Wikipedia

Assessoria de Comunicação

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Instituto de Física de São Carlos - IFSC Universidade de São Paulo - USP
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