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2 de junho de 2017

A transmissão matemática de ideias

“Era exatamente isso que eu estava tentando dizer! Parece que você leu meus pensamentos!”. As frases anteriores certamente já foram ditas ou ouvidas diversas vezes pelo leitor desta matéria. Porém, conseguir transmitir precisamente o que estamos pensando a uma terceira pessoa pode não ser tão simples quanto parece, e sabemos que essa dificuldade é corriqueira em nosso cotidiano. Imagine, então, se existisse um modelo matemático que fosse capaz de mostrar o caminho através do qual nossas ideias pudessem ser expressas a alguém exatamente da maneira como gostaríamos?

Luciano_da_Fontoura-_TIEsse “sonho semântico” está mais próximo de se tornar realidade, graças a um estudo encabeçado por Luciano da Fontoura Costa, docente e coordenador do Grupo de Computação Interdisciplinar do Instituto de Física de São Carlos (IFSC/USP). “Esse é nosso trabalho mais recente, e tem um aspecto bem geral. Nossa inspiração foi a Teoria da Informação, que teve como principal desafio criar uma abordagem que permitisse transportar de forma otimizada e/ou mais íntegra possível mensagens através dos sistemas comunicação existentes à época, principalmente cabos de telefonia, relativamente ruidosos e com banda limitada”, explica o docente.

Com o surgimento da Teoria da Informação (TI), alguns teóricos (inclusive seu próprio propositor, Claude Shannon) passaram a estudar maneiras de compactar a informação de maneira eficiente, removendo redundâncias. “Imagine que tenhamos um texto escrito e queiramos compactá-lo para armazenamento ou transmissão. Escolhe-se um código binário mais curto para a letra que aparece com mais frequência, como a letra ‘A’, por exemplo. Ao usarmos esse código otimizado para representá-la, estamos compactando o texto no sentido de o código binário utilizado para a letra A ocupar menos bits”, elucida Luciano. “A mesma abordagem pode ser também usada a nível de palavras, sentenças etc.”.

Estudando Redes Complexas (RCs) há muitos anos, Luciano teve a ideia de conectar as duas teorias (RCs e TI), focando na seguinte premissa: não existe série temporal ou sequência de símbolos que não tenha um gerador respectivo. Ou seja, qualquer som ou outro tipo de sinal é produzido por algo (um dispositivo ou a natureza) ou alguém (uma pessoa). “A partir de 1999, as RCs surgiram como sendo grafos com estruturas relativamente intrincadas, capazes de modelar virtualmente qualquer sistema discreto. Nossa ideia, então, foi justamente estudar esse tipo de grafo, tendo em vista a busca de novos métodos, conceitos e aplicações”, explica.

Trabalhando com a ideia de que qualquer sistema gerador pode ser representado por um grafo, para otimizar e entender exatamente as mensagens que o sistema gerador possa produzir, Luciano chegou à conclusão que seria muito pertinente estudar as redes que geram as sequências, isto é, “abordar a raiz do problema”. “Estudando o sistema gerador, torna-se mais efetivo se entender as sequências que ele pode produzir. Para entendermos nossas conversas, por exemplo, é melhor estudar nossa fala ou o próprio cérebro? É possível fazer as duas coisas, mas o estudo fica mais completo com o estudo do sistema gerador, as redes neuronais”, exemplifica o docente.

Embora não seja possível ter-se com facilidade acesso aos sistemas geradores e como eles produzem mensagens, é possível se trabalhar com hipóteses e modelos matemático-computacionais, que foi exatamente o que fez Luciano e seus colaboradores em um recente trabalho, que estudou vários tipos de grafos e dinâmicas de geração/transmissão de sequências.

A Reconstrução de Ideias

Mas como o estudo de Luciano pode auxiliar na difícil tarefa de conseguirmos transmitir uma mensagem da maneira mais clara e eficiente, conforme citado no primeiro parágrafo da matéria? De fato, a tarefa continua sendo complexa, mesmo com o modelo matemático proposto. Mas ela pode se tornar muito mais simples, conforme for sendo melhor compreendida.

Luciano_da_Fontoura-_TI_1Ao falarmos, a sequência de símbolos e palavras proferidos vai sendo processada em nosso cérebro de maneira subjetiva, ou seja, de acordo com nosso entendimento — o que pode não ser, necessariamente, a ideia que o emissor está tentando passar. Quanto mais dados tivermos, que no caso de uma conversa envolve maiores quantidades de informações que nos vão sendo passadas, melhor será a reconstrução das ideias originais. “Uma sequência curta tem menos redundância e pode ser transmitida com maior velocidade, mas isto implica em ausência de reforço, desejável em situações envolvendo ruído e/ou volatilidade. Com efeito, ainda é desconhecida a forma ótima de transmissão de ideias. Mas os critérios podem ser escolhidos pelo emissor, ao definir quanto a sequência deve ser compactada, quanta redundância deve conter etc., levando a resultados mais compatíveis com cada caso”, explica Luciano.

O docente e seus colaboradores, portanto, estudam os diversos meios que podem atender aos requisitos necessários para que seja formada uma sequência adequada para o entendimento de algo. E para encontrar esta sequência ótima, o estabelecimento de critérios, como acima comentado, é primordial. “O que se espera que seja bom em uma sequência? A definição de critérios que atendam aos requisitos desejados é de extrema importância”, afirma, “pois tais critérios podem, então, ser incorporados na análise e projeto de respectivas dinâmicas para percorrer as redes geradoras”.

Como já dito anteriormente, as aplicações são ilimitadas. Buscar algoritmos que descrevam uma sequência ótima de aprendizado, que possa ser transmitida verbalmente ou escrita em texto, é uma delas. Mas a ideia pode ser expandida para a compreensão de qualquer sistema, inclusive biológico, computacional, ou mesmo artístico. “Um bom modelo matemático permite validação. Ou seja, ao construir um modelo assim, é preciso que ele permita previsões sobre o objeto de estudo. O que fizemos foi construir um modelo adaptável e preditivo”, explica o docente.

Luciano já tem alguns resultados experimentais dessa pesquisa, e pretende explorar outros modelos de redes. “Já estudamos diversas topologias de grafos, e trabalhamos com diferentes dinâmicas de exploração dos mesmos. Aplicamos cada dinâmica em cada um dos modelos, para averiguar qual delas é mais eficiente em cada caso, e já tivemos resultados interessantes”, adianta Luciano. “Verificamos, por exemplo, que certos modelos de redes geradoras, mais especificamente as livres de escala, como a WWW, redes sociais e aeroportos, podem levar a uma reconstrução muito rápida ou muito lenta, dependendo criticamente da dinâmica utilizada para percorrê-las”.

O modelo construído por Luciano traz mais uma pista a respeito do entendimento sobre a natureza, ao integrar vários elementos que dela fazem parte.

Imagem- Arcabouço básico da integração entre Redes Complexas e Teoria da Informação. Rede original, por exemplo, representando uma ideia a ser transmitida, seu mapeamento em uma sequência de símbolos obtido por amostragem através de uma certa dinâmica D, e a reconstrução da rede original realizada por um receptor (Crédito da imagem: Luciano da Fontoura Costa)

Assessoria de Comunicação- IFSC/USP

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Instituto de Física de São Carlos - IFSC Universidade de São Paulo - USP
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