Notícias

1 de junho de 2011

Docente do IFSC conta sobre o que o levou a desistir da medicina para mergulhar no misterioso e complexo mundo das proteínas

Movido pela paixão em desvendar a estrutura de proteínas, professor fala sobre sua colaboração em importantes pesquisas brasileiras e sobre nova proteína que tem protagonizado seus estudos e pode ocupar importante papel contra doenças degenerativas

Breve biografia

“Eu poderia me classificar um apaixonado pelas estruturas de proteínas”, se autodefine o pesquisador e professor do Instituto de Física de São Carlos (IFSC), Richard Charles Garratt que, desde quando cursava o ensino médio, questionava-se sobre as possibilidades e os porquês da complexa estrutura de proteínas e seus arranjos no espaço que nos rodeia. “Todo sábado, durante o colegial, eu ia até a biblioteca municipal de minha cidade e, em um dos livros que eu costumava ler, chamado‘Life on earth’, havia muitas figuras de estruturas proteicas, o que para mim, naquela época, era incompreensível e parecia algo impossível de se mapear!”, conta o docente.

Terminado o colegial, Richard aventurou-se, por dois anos, na famosa Escola de Medicina de Guy’s Hospital em Londres na Inglaterra- inclusive, seu país de origem- e foi quando viu, definitivamente, que medicina não era sua vocação.  “Descobri que eu gostava, realmente, de ciência básica, e não da prática cotidiana da medicina. Então, desisti de ser médico, para iniciar minha graduação em Ciências Médicas Básicas e Bioquímica, pela University of London”.

Em 1989, depois de ter concluído seu mestrado e iniciar seu doutorado, ambos em Cristalografia, também na University of London, teve seu primeiro contato com o atual presidente do CNPq, Glaucius Oliva, que, na época, cursava o doutorado, junto a Richard. “Glaucius foi fazer o doutorado, justamente quando terminei meu mestrado. Começamos nosso doutorado no mesmo dia e, naquele momento, a cristalografia de proteínas estava no auge! Na época, era algo muito difícil de ser feito. Quando concluí meu doutorado, por alguma razão não me senti atraído em ir para algum laboratório bem instituído, com tudo montado e caras famosos. Eu achava que vir para um lugar, no qual ainda não havia nada estabelecido, em termos de cristalografia, seria o verdadeiro desafio! E decidi vir para o Brasil. No final da história, nosso grupo de Cristalografia foi o primeiro a se estabelecer na América Latina”, conta.

As várias aplicações

Embora de significativo cunho teórico, os estudos de Richard e seu grupo não se limitam, apenas, à pesquisa básica, de conteúdo meramente acadêmico, mas visam experimentos práticos, que tem seu objetivo final diretamente relacionado ao cotidiano de muitas pessoas. “De nossos estudos, os mais citados estão envolvidos na área de biotecnologia, em indústrias farmacêuticas. Conhecer a estrutura de moléculas-alvo é de grande importância para o desenvolvimento de novos fármacos”, explica o docente. “Através de pesquisas básicas, descobrimos como uma proteína funciona para, posteriormente, estudar suas aplicações”.

Richard é, atualmente, coordenador do Instituto Nacional de Biotecnologia Estrutural e Química Medicinal em Doenças Infecciosas (INBEQMeDI), programa do qual fazem parte diversos pesquisadores do Brasil, inclusive do IFSC. “Os estudos do INBEQMeDI têm um viés mais direcionado ao desenvolvimento de fármacos e vacinas, terapias e diagnósticos. A maioria das doenças infecciosas, que tem a ver com os fármacos e vacinas que estudamos desenvolver, são tipicamente brasileiras, como a doença de Chagas, esquistossomose,  leishmaniose, que estão enumeradas como as mais graves, e matam milhões de pessoas ao ano”, conta Richard.

Resultados e novos desafios

Um destaque em sua pesquisa refere-se à colaboração com a Fundação Osvaldo Cruz. “Há mais de uma década, colaboro com o grupo coordenado pela médica e pesquisadora, Miriam Tendler, para o desenvolvimento de uma vacina contra a esquistossomose. Embora eu não tenha me envolvido diretamente com essa pesquisa ao longo dos últimos anos, que hoje se encontra em um novo patamar, inclusive já com testes clínicos, no início desse projeto, nosso conhecimento sobre a estrutura da molécula antigênica, Sm14, foi essencial, o que levou a publicações importantes, geração de patentes e interesse de indústrias, que hoje estão coordenando testes em humanos, para o eventual lançamento da primeira vacina contra esquistossomose”, conta.

Ainda ao que se refere à parte experimental, Richard tem se dedicado, atualmente, aos estudos de um grupo de proteínas, chamadas “septinas”, moléculas importantes para uma série de processos celulares, fundamentais à vida. “As septinas são moléculas que formam filamentos, estes, por sua vez, essenciais para interação com a membrana das células, para exercer suas funções vitais, como divisão celular, transporte de vesículas, entrada e saída de material nas células. Atualmente, tentamos compreender como essas moléculas formam filamentos e como estão relacionadas à atividade biológica”, explica. “Hoje não estudamos essas moléculas com vistas à aplicação, mas nada impede que, no futuro, elas sirvam de base para o desenvolvimento de novas terapias, uma vez que septinas já foram associadas a diversas enfermidades”, afirma Richard.

Sobre algumas técnicas

A maneira de compreender a complexidade de uma proteína pode ser através da utilização de diversas técnicas. Uma das mais utilizadas pelo pesquisador é a chamada “Difração de raios-X”, que consiste na caracterização de cristais da proteína de interesse. “Enquanto ainda estudante no colégio, descobri que a maneira de desvendar o problema da complexidade de uma proteína era pela difração de raios-X, usando cristais.  Porém nunca imaginava que eu mesmo teria oportunidade de desenvolver este tipo de trabalho!”

Além das técnicas em cristalografia, são utilizadas outras complementares, para auxiliar na identificação e mapeamento das proteínas. “Junto à técnica de difração de raios-X, utilizamos ressonância magnética nuclear, microscopia eletrônica etc. Hoje em dia, é necessária a utilização de mais de uma técnica para desvendar um problema biológico mais complexo, pois cada uma aborda o problema de maneira diferente e apresenta informações distintas. Essa soma é que traz um bom entendimento do problema”, esclarece Richard.

Em março deste ano, Richard participou de um congresso na Alemanha, onde apresentou alguns resultados e conclusões referentes à pesquisa com septinas. “Em função dos resultados apresentados no congresso, grupos de pesquisa dos Estados Unidos e Israel já demonstraram interesse em firmar parcerias”, conta.

Das parcerias já existentes, Richard afirma que a colaboração de outros grupos foi fundamental durante os anos; ele conta com a intensa participação do Grupo de Biofísica do IFSC, através da docente, Ana Paula Ulian Araújo, além de um grupo de pesquisadores de Campinas, liderado por Jorg Kobarg, que trabalha no Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS). “Conseguimos complementar as pesquisas entre esses grupos e atingimos resultados mais importantes”, conta.

Já em relação a aplicações com septinas, o docente afirma que ainda não é possível dizer quais serão as consequências. “Algumas septinas foram associadas a doenças degenerativas, como Mal de Parkinson e Mal de Alzheimer. Já foi observado, em cérebros post mortem de pacientes com Alzheimer, depósitos de septinas, junto a proteínas diretamente associadas à doença. Ainda não se sabe o que significa: se foram importantes para desencadear o processo ou se foram meramente agregadas. Não sabemos, ainda, o valor desse achado, mas isso só poderá ser desvendado no futuro”, finaliza.

Assessoria de Comunicação

Data: 1º de junho

Imprimir artigo
Compartilhe!
Share On Facebook
Share On Twitter
Share On Google Plus
Fale conosco
Instituto de Física de São Carlos - IFSC Universidade de São Paulo - USP
Obrigado pela mensagem! Assim que possível entraremos em contato..